QUÓRUM ACADÉMICO
Vol. 16 Nº 1, Enero-Junio 2019. Pp. 23-38
Universidad del Zulia
Juliana Soares Mendes1
Reflexões acerca da experiência de discutir conceitos sobre tecnologia nas aulas de graduação da disciplina “Introdução à comunicação” da Universidade de Brasília de 2012 a 2013 e nas aulas de especialização das disciplinas “Mídia, tecnologia, informação e comunicação” e “Narrativas jornalísticas digitais - transmídia e storytelling” do Instituto de Educação Superior de Brasília de 2015 a 2018. Houve um esforço de contextualizar as novas mídias na história e a partir de um regime dos meios de comunicação. O planejamento das aulas considerou alguns recursos de apoio, como o documentário sobre a obra de McLuhan e as orientações do professor David Bobbitt. No fim, os alunos foram convidados a aplicar as idéias debatidas em productos de comunicação.
Recibido: Noviembre 2018 – Aceptado: Diciembre 2018
Este obra está bajo una licencia de Creative Commons Reconocimiento - NoComercial - CompartirIgual 3.0 Unported.
La enseñanza y el debate sobre la tecnología en disciplinas de comunicación: buscando regresar a los conceptos cotidianos relevantes para los estudiantes
Estas son reflexiones sobre la experiencia de discutir conceptos sobre la tecnología en clases de grado de la disciplina “Introducción a la comunicación” de la Universidad de Brasília de 2012 a 2013 y en clases de posgrado de las disciplinas “Media, tecnología, información y comunicación” y “Narrativas periodísticas digitales” del Instituto de Educación Superior de Brasília de 2015 a 2018. Se hace el esfuerzo de contextualizar los nuevos medios en la historia, a partir de la ecologia actual de los medios de comunicación. El planeamiento de las clases considera algunos recursos de apoyo, como el documental sobre la obra de McLuhan y los consejos del profesor David Bobbitt. Los estudiantes fueron invitados a aplicar las ideas en productos de comunicación
No período de outubro a dezembro de 2016, 64,7% da população brasileira com mais de 10 anos de idade usou a internet (IBGE, 2018). A quantia é de aproximadamente 116 milhões de pessoas conectadas e partici- pando, em alguma medida, do meio digital. A presença da tecnologia tem se tornado constante na vida das pessoas, em especial devido aos dispositivos móveis. As noções de tempo e espaço se modificam, de modo que as pessoas não estão mais restritas às comunidades físicas e territoriais de antes, mas se conectam em comunidades de interesse e por questões identitárias em novos fóruns de debate (Alonge, 2006). Diferente dos meios de comunicação de massa, que procuram alcançar grandes públicos com informações genéricas, as mídias digitais se pautam pelo nicho. Ou seja, um público bem segmen- tado e protagonista, engajado com informações aprofundadas sobre temas específicos (Primo, 2005; Ribeiro, 2010).
Considerando que existe um regime dos meios de comunicação (Jen- kins, 2009) – no qual as antigas mídias não desaparecem, mas as linguagens e relações criadas por essas se acumulam – características e aspectos sociais
são arranjados e rearranjados com a dimensão assumida pelos meios digi- tais. Em face dessas transformações, a tecnologia suscita discussões rele- vantes para a compreensão da sociedade contemporânea e o ensino desse tema se torna um desafio. O presente artigo relata as reflexões sobre o papel do professor na intermediação desse conhecimento, focalizando a experiên- cia com turmas de graduação na disciplina “Introdução à comunicação” (de 2012 a 2013 na Universidade de Brasília - UnB) e de especialização nas disciplinas “Mídia, tecnologia, informação e comunicação” e “Narrativas jornalísticas digitais - transmídia e storytelling” (de 2015 a 2018 no Ins- tituto de Educação Superior de Brasília – IESB). A última disciplina, com uma proposta laboratorial, foi compartilhada com os professores Leyberson Pedrosa e Diego Iraheta.
Nas próximas linhas deste artigo são apresentadas reflexões e aborda- gens desenvolvidas em sala de aula para intermediar o debate sobre tecnolo- gia. O primeiro ponto que orienta a apresentação de conceitos aos alunos é a compreensão de que os meios digitais não se desenvolveram em um vácuo na história. Alguns autores são fundamentais para essa compreensão, em especial Marcos Palácios (2014) e Asa Briggs e Peter Burke (2006).
Para alcançar o debate sobre o presente, Palácios parte dos primórdios da comunicação, quando os primeiros registros foram realizados e imorta- lizaram eventos. Desde então, a memória se tornou artificial e externa aos seres humanos. Essa relação se mantém hoje em dia, em especial quando grupos disputam as narrativas em novos suportes da internet. O objetivo do conflito é tornar hegemônica a sua interpretação dos acontecimentos. Afinal, como lembra Marialva Barbosa (2009), o passado e presente não são pontos fixos, mas sofrem entrelaçamentos e rememorações que modificam como as memórias são lembradas e acessadas.
Essa guerra de memórias se torna visível nos comentários e inter- venções nos conteúdos produzidos e publicados na internet, como aponta Palácios ao utilizar o conceito de marginália jornalística. Isto é, a colabo- ração dos internautas se assemelha aos escritos deixados nas margens dos livros pelos monges copistas. Atualmente a contribuição ocorre por comen- tários, mas também pela mixagem ou reedição de discursos e formatos, criando novos conteúdos.
A exemplificação dessas ideias se tornou necessária em sala de aula
para os estudantes buscarem novas referência e perceberem como já conso- mem e exploram o potencial dessas características do meio digital (e como podem cada vez mais se apropriarem conscientemente dessas práticas). No caso da Marginália e guerra de memórias, o exemplo recorrente apresentado é aquele das fanpages Caneta Desmanipuladora (www.fb.com/canetades- manipuladora) e Caneta Desesquerdizadora (www.fb.com/desesquerdiza- da). O primeiro perfil recolhe notícias divulgadas por portais e questiona algumas palavras utilizadas e a suposta objetividade jornalística. O segundo perfil também reescreve o conteúdo noticioso a partir de uma crítica ao que os administradores da fanpage consideram pensamento de esquerda.
Ilustração1. Caneta Desmanipuladora
Fonte: fb.com/canetadesmanipuladora
Ilustração 2 - Caneta desesquerdizadora
Fonte: fb.com/desesquerdizada
Em ambas as imagens a matéria-prima para criar o conteúdo são as manchetes das notícias. Contudo, a intervenção do usuário pode modificar totalmente o primeiro sentido sugerido pelo jornalista, criando um novo dis- curso. Da mesma forma, a escrita nas margens dos livros também servia para complementar, contrapor e até mesmo assumir a função de relacionar outra literatura similar (funcionalidade assumida pelos hiperlinks atualmen- te). Ou seja, lembrar aos alunos que há um desenvolvimento história da tecnologia e uma inter-relação entre práticas do passado e do presente per- mite apontar que a noção de interação e/ou participação (Carpentier, 2012) não é algo novo criado pela internet. Pelo contrário, as diferentes formas de comunicação abrem esse espaço, inclusive antes do marco da invenção da prensa gráfica, com as cópias manuscritas de livros.
Nessa direção, Asa Briggs e Peter Burke (2006) lembram da co- municação multimídia que ocorria no início da idade moderna na Europa. Eles citam como exemplos paradas militares, espetáculos, óperas, peças de
teatros e procissões religiosas e seculares. Nesses espaços, se conjugavam elementos visuais, sonoros e verbais para transmitir uma mensagem para o público: “A comunicação era um processo de duas vias, uma forma de diá- logo, e os príncipes demonstravam sua boa vontade em relação aos súditos, ao mesmo tempo que recebiam aplausos” (Briggs; Burke, 2006: 50).
Nos últimos anos, novas tecnologias surgiram e tornaram possível reunir em um único espaço virtual texto, imagem e som. Contudo, o obje- tivo de envolver o público com a mensagem permanece, a exemplo da his- tória multimídia de 2012 do New York Times, “Snow Fall: The Avalanche at Tunnel Creek” (Queda da Neve: A Avalanche de Tunnel Creek), escrita pelo jornalista John Branch e disponível em http://www.nytimes.com/pro- jects/2012/snow-fall/index.html. O estilo da reportagem – que sistematizou em um design convidativo trechos de vídeos, áudios, animações e mapa
– inaugurou um modelo para o jornalismo digital e inspirou outras reporta- gens especiais planejadas para a internet. No dias de hoje, algumas empre- sas de notícia mantêm uma sessão sessões especiais para esses produtos, a saber:
Empresa Brasil de Comunicação: http://www.ebc.com.br/especiais;
Agência Pública: https://apublica.org/especial;
Folha de S. Paulo: https://www1.folha.uol.com.br/especial;
Estadão: https://www.estadao.com.br/infograficos.
Essas primeiras considerações são essenciais para contextualizar as turmas e prepara-las para o debate sobre as idéias de um pensador que se tor- nou marco quando o assunto é tecnologia: Marshall McLuhan. Na experiên- cia com as turmas de “Introdução à comunicação”, “Mídia, tecnologia, in- formação e comunicação” e “Narrativas jornalísticas digitais”, a percepção é de que as metáforas criadas por McLuhan são provocadoras e instigam os estudantes a pensarem sobre o papel da tecnologia em suas vidas e pro- fissões. Porém existe também a necessidade de relativizar ou redimensionar algumas afirmações, principalmente devido à crítica constante daqueles que enxergam um determinismo tecnológico em suas palavras. Como identifica Vinícius Andrade:
“Boa parte dos críticos de McLuhan o rejeitaram a par- tir de um mal entendido, em relação ao célebre aforismo, o
meio é a mensagem, interpretando, a partir do mesmo, que McLuhan desprezava o conteúdo de um meio como mensa- gem. Esta interpretação parecia ser confirmada a partir de fra- ses soltas que McLuhan proferia de forma não sistemática, ao longo de conferências, textos avulsos, livros e entrevistas, quando buscava explicitar melhor a sua idéia de meio como sinônimo de extensões tecnológicas”. (Pereira, 2004: 4).
Portanto, a compreensão do desenvolvimento histórico das mídias e da perspectiva de um regime dos meios de comunicação facilita o debate sobre McLuhan e evita simplificações sobre o poder e o potencial da internet e da tecnologia digital. A leitura do artigo “Internet e Sociedade em Rede” de Manuel Castells é um bom apoio para essa contextualização, uma vez que o autor reúne pesquisas e dados estatísticos para verificar como os laços sociais se fortalecem e enfraquecem com a internet, chegando à conclusão de que: “A Internet é um instrumento que desenvolve, mas que não muda os comportamentos; ao contrário, os comportamentos apropriam-se da Inter- net, amplificam-se e potencializam-se a partir do que são” (Castells, 2005: 273).
Outro apoio surge dos argumentos de Henry Jenkins (2009), que en- fatizam que os meios de comunicação não desaparecem quando um novo se torna hegemônico. O autor explica que são as tecnologias de distribuição que se tornam obsoletas. Ou seja, ainda acessamos e escutamos música, mas os CDs players, os vinis e as fitas não são mais comuns como em outra épo- ca. Entretanto, para além de uma tecnologia, esses meios de comunicação também criam protocolos, aquelas práticas culturais e sociais associadas a eles e que fazem de um sistema maior. Esses sistemas são dinâmicos e se complementam. A televisão instaurou um meio de assistir aos programas e filmes e, em 1970 e 1980, a audiência necessitava se adequar aos horários da programação. A partir de 1980, com a possibilidade de gravar o conteúdo, essa relação se modifica (com conseqüência para o formato das narrativas contadas).
O entendimento de que há uma dinâmica e complexidade na relação dos seres humanos com a tecnologia também se aplica às idéias de McLu- han, em especial aos meios quentes e frios. McLuhan (2007) considera como meios quentes aqueles ampliam, em alta resolução, um dos sentidos humanos (tato, audição, visão etc.) e, portanto, necessita pouca participação
do público e configura sociedades mais individualizadas. Por outro lado, os meios frios fornecem pouca resolução e informação, que demanda ser completada pelo interlocutor e, portanto, exige a participação e formas de interação mais coletivas. Em seu livro “Os meios de comunicação como ex- tensões do homem”, McLuhan analisa diferentes meios e os encaixa na cate- goria de frios e quentes. Porém, considerando que ele indica a possibilidade de aquecimento e resfriamento dos meios, há que se considerar que essas ca- racterizações são passíveis de mudanças para o rádio, televisão, cinema, etc.
Segundo o professor David Bobbitt (2011), que ensina McLuhan para os seus alunos há décadas, é preciso compreender os meios quentes e frios não como definições estáticas, mas dinâmicas e que se referem aos efeitos e as experiências vividas ao utilizar as mídias. O artigo de Bobbitt e o docu- mentário “McLuhan’s Wake” (2009) do diretor Kevin McMahon e se torna- ram recursos importantes para o planejamento das aulas e para comunicar aos estudantes o principal pensamento de McLuhan, sintetizado na frase “o meio é a mensagem”.
O autor considera as tecnologias como extensões dos sentidos huma- nos: é o binóculo que amplia a visão, o carro que aumenta a capacidade de deslocamento das pernas e os computadores conectados que criam um sis- tema nervoso central. Ao utilizar esses meios, os usuários são moldados por essa tecnologia, que estabelece outras lógicas e formas de estar no mundo. O documentário contribui para as aulas ao criar a atmosfera e apresentar ilustrações para as reflexões de McLuhan.
Um trecho selecionado para exibição para as turmas começa aos 35 minutos e 50 segundos, quando a narradora explica que os seres humanos se desvencilham dos antigos ritmos da noite e do dia, criando ambientes com o clicar da tomada. Afinal, como afirma McLuhan (2007:22), a análise da luz é esclarecedora, pois essa tecnologia “é algo assim como um meio sem men- sagem”. No filme há uma sucessão de ambientes iluminados e a pergunta se ainda é possível seguir a luz da lua.
Ilustração 3 - Luz como tecnologia
Fonte: McLuhan’s Wake
Nesse momento da aula, é solicitado aos estudantes interpretarem a frase e porque o filme fala sobre a luz da lua. Para orientar a reflexão, é questionado se existem diferenças entre como pessoas em centros urbanos e aquelas em áreas (rurais ou no passado) sem acesso à eletricidade lidavam com o espaço e o tempo. Comumente, os alunos explicam que a lua e o sol regiam os locais sem energia, mas, nos centros urbanos, as horas se esten- dem para além do por do sol e inúmeras atividades de trabalho, estudo e lazer são desenvolvidas nos ambientes criados pela luz.
Além da atmosfera, o documentário permite também aos alunos con- hecerem mais da vida de McLuhan e ouvir os seus discursos, como defende Bobbitt ao indicar o documentário para as aulas. De acordo com o professor, o feedback dos alunos é positivo – apesar das dificuldades enfrentadas para entender McLuhan – e que há uma identificação com essas teorias, pois elas os ajudam a entender o mundo atual.
De forma similar, os estudantes de “Introdução à comunicação”, “Mídia, tecnologia, informação e comunicação” e “Narrativas jornalísticas digitais” se envolvem no debate e apresentam questões que enriquecem o
debate. Um momento importante das disciplinas são os trabalhos que esti- mulam a turma a aplicar os diferentes conceitos estudados durante o curso, que compreende a tecnologia, a mídia e a linguagem digital.
No caso dos estudantes de “Introdução à comunicação”, uma vez que a disciplina aborda temas mais amplos e diversos, as turmas foram convi- dadas a escrever artigos e produzir uma publicação online. O programa de ensino da disciplina foi sistematizado nas seções: O que é comunicação; A história e as especificidades dos meios de comunicação; Tecnologias da Informação e Comunicação e “novas mídias”; Introdução às teorias da co- municação; Comunicação, consumo e cidadania; Profissões da área da co- municação.
Os aspectos introdutórios da disciplina e o caráter analítico resulta- ram em três publicações: dois “Dicionários Ilustrados da Comunicação” e a publicação “Produtos de Comunicação: Análise Histórica”. O conteúdo está disponível em: https://introducaocomunicacao.wordpress.com.
Ilustração 4 – Publicações das turmas de Introdução à Comunicação
Fonte: Blog Introdução à Comunicação - UnBComunicação
Os dicionários explicam termos como: aldeia global, comunidade virtual, direito autoral, folkcomunicação, hipertexto, inclusão digital, infografia, podcast e webcast. Enquanto isso, a terceira publicação realiza comparações históricas de produtos da cultura pop, que são consumidos pelos alunos e os estimulam a utilizar os conceitos das aulas para refletir sobre o que está ao seu redor. Alguns produtos analisados foram: Chaves, Resident Evil, Mickey Mouse, Turma da Mônica, Homem-Aranha, Coca- Cola, Havaianas, Vogue e iPhone.
Por outro lado, com as turmas de especialização houve oportunidade
de aplicar os conceitos de tecnologia para a produção de conteúdo mais autoral e sintonizado com as linguagens dos meios digitais. Os alunos de “Mídia, tecnologia, informação e comunicação” criaram e atualizaram páginas na rede social Facebook, produzindo conteúdo considerando a interação, o uso de formatos multimídias, a conexão com uma comunidade virtual (baseada em questões identitárias) e a lógica do meio digital. As turmas entregaram as seguintes páginas:
Brasília Natural (https://bit.ly/2Caxc4p);
BsB por 30 (https://bit.ly/2owZiwY);
Caprichos da Kika (https://bit.ly/2PvmS8R);
Família Cervejeira (https://bit.ly/2oxrsIa);
Na Real (não mais disponível);
Naturalmente Brasília (https://bit.ly/2C9iSc5);
Português sem vergonha (não mais disponível);
Tio Darcy (https://bit.ly/2owJdqQ);
Tofu Candango (https://bit.ly/2PSHqJg);
Vitrine Urbana (https://bit.ly/2NacaqF).
De uma forma geral, os alunos foram muito criativos na forma de aplicar os conceitos e entender o potencial de comunicação dessa mídia social a partir de sua inserção em um desenvolvimento histórico e um regime de meios de comunicação. Utilizando a página Brasília Natural para ilustrar, o grupo de estudantes que administrou a rede social apresenta a iniciativa da seguinte maneira: “Tá pensando que Brasília é só concreto? Né não! Vamos descobrir juntos o lado natural do nosso quadradinho do Cerrado”. Há um estabelecimento bem delimitado do público das mensagens. Apesar de uma definição territorial de Brasília, a identificação também procura alcançar características mais relacionadas com gostos e valores. Isto é, são pessoas que gostam da natureza e desenvolvem atividades ao ar livre. Essa escolha é representada na identidade visual criada, que utiliza o verde e duas folhas na marca. Além disso, os posts divulgaram informações sobre as espécies de flora, os parques da cidade e eventos abertos. O esforço de consolidar uma comunidade virtual ocorreu também com a parceria com outras páginas do
Facebook que possuem público parecido.
A proposta da página era promover a ocupação de espaços públicos pelos internautas, aproveitando a linguagem digital para alcançar esse fim. Dessa maneira, os posts frequentemente utilizaram a funcionalidade de localização geográfica do Facebook para informar os lugares retratados nas fotografias. Além disso, a interação foi estimulada com a linguagem informal e o uso de gírias. E a multimidialidade foi atingida com a associação de diferentes formatos: textos, fotografias, vídeo e a transcrição de trechos de música.
Para promover a intervenção do público na página do Facebook, o grupo realizou uma atividade presencial. Saquinhos com sementes foram deixados em um evento ao ar livre, na esperança que as pessoas aleatórias os encontrassem e entrassem em contato pela rede social. Havia um bilhete em cada saquinho com instruções para o plantio das sementes de girassol e o pedido para tirar uma foto e enviar para o projeto.
Por fim, a disciplina laboratorial “Narrativas jornalísticas digitais” resultou em três produtos: a reportagem especial “Vida Fitness: muito além do frango e batata doce” (http://futurofit.wixsite.com/futurofit), o conteúdo multimídia “Menu de Amor” (https://www.instagram.com/menudeamor) e um conjunto de narrativas publicadas na rede social Instagram sobre a gastronomia tradicional de Brasília, a capital do Brasil.
A prática laboratorial da disciplina exigiu a capacidade de inovação dos estudantes e também a habilidade de gerenciar diferentes atividades necessárias à produção: apuração, pesquisa em bancos de dados, entrevistas com fontes, redação e interação com o público. Para ilustrar a prática dos conceitos estudados, reportagem especial “Vida Fitness” foi selecionada. O parágrafo de abertura do produto explica a iniciativa:
“Lanche da tarde: cenoura e tomate picadinhos com azeite; sobremesa: não faz questão; diversão: aproveitar sábados ensolarados para andar de bicicleta no Parque da Cidade e nadar na academia durante a semana. Esses são os hábitos de Marina Diniz Ribeiro. [...] Ela reflete a onda fitness crescente no Brasil e no mundo, em que as pessoas buscam constantemente por alimentos saudáveis, atividades físicas e auxílio de profissionais. Mas, afinal, o que está por trás desses
novos hábitos? É a procura por saúde, beleza, ou aceitação social? O Vida Fitness apresenta os aspectos desse universo, que vai muito além do frango e da batata doce.”
Um desafio lançado à turma foi o de criar um universo transmídia. De acordo com Jenkins (2009), para além de uma convergência tecnológica das mídias, ocorre uma convergência cultural. Isto é, a proliferação de aparelhos e janelas altera a maneira de produzir e consumir os meios de comunicação:
"A convergência não envolve apenas materiais e serviços produzidos comercialmente, circulando por circuitos regulados e previsíveis. […] A convergência também ocorre quando as pessoas assumem o controle das mídias. […] Nossa vida, nossos relacionamentos, memórias, fantasias e desejos também fluem pelos canais de mídia.” (Jenkins, 2009: 45).
Nesse sentido, o universo transmídia é convidativo à participação e criação do público. Se antes um filme se encerrava com o final da história, agora há a possibilidade de novas narrativas em outros filmes, livros, histórias em quadrinhos, games e até fan fictions que se passam no mesmo universo. Ou seja, cada novo produto lança luz sobre um novo canto do universo que não era conhecido, porém, ao mesmo tempo, segue as mesmas regras e padrões estabelecidos pelo filme original.
Para definir o universo, o grupo identificou personagens envolvidos nessa comunidade de exercícios, dieta saudável e equilíbrio. Entre eles, havia uma criança, uma fisiculturista, pessoas que transformaram sua vida, idosos e especialistas. A história foi narrada em diferentes formatos e plataformas para ampliar o universo: webdocumentário, infográficos, testes interativos, site, YouTube, Instagram, entre outros. A soma dessas narrativas espalhadas por diferentes suportes na internet permitiu várias portas de entrada para o público e formou um todo coeso e aprofundado sobre as tendências e hábitos de uma vida saudável.
A apropriação do conceito de transmídia é particularmente difícil para o jornalismo, considerando que o termo nasceu a partir dos produtos da indústria do entretenimento e, como exposto pelos alunos em sala de aula, várias técnicas e práticas ensinadas no curso de especialização são novidades para os profissionais que atuam na área.
Por um lado, o regime dos meios de comunicação e os avanços
tecnológicos têm criados novas linguagens que se alteram rapidamente em um curto espaço de tempo. Portanto, da graduação até a especialização, muito desse cenário se transformou e a possibilidade de uma formação continuada permite atualizações e reflexões que podem servir como ferramentas para entender esse mundo em constante mutação. Por outro lado, há a constante necessidade de se repensar os currículos dos cursos de Comunicação para que a sua estrutura possa refletir a produção de conteúdo para o meio digital e o mercado que ultrapassa a tradicional redação do Jornal ou a agência publicitária.
Nesses poucos anos, promovendo o debate sobre tecnologias, a percepção é de que as análises e os conceitos apresentados interessam os alunos, pois o meio digital faz parte de suas vidas. Essas novas mídias os acompanham cotidianamente e suscitam novas formas de se relacionar, comunicar, estudar, trabalhar e consumir. As discussões podem, então, ampliar a compreensão de como eles se colocam no mundo e como eles podem se apropriar dessas plataformas e se tornarem produtores de conteúdo. Estimular essa capacidade pode ser importante profissionalmente, mas também como uma forma de consolidar o letramento nessas novas linguagens hegemônicas e que exigem a criatividade. Inclusive, muitos desses alunos já são produtores independentes de conteúdo – em canais no YouTube, blogs e experiências anteriores de Trabalhos de Conclusão de Curso de graduação – e as habilidades que possuem auxiliam os colegas no processo criativo e de planejamento das atividades. Na sala de aula, convencionalmente há troca e aprendizado por parte de professores e alunos e, quando o tema é tecnologia, esse potencial se amplia pela característica inclusiva e intuitiva das mídias digitais.
Alonge, Wagner (2006). Ágoras digitais: a emergência dos blogs no ciberespaço e suas implicações na sociabilidade e cultura midiática. Congresso Anual da Associação Brasileira de Pesquisadores de Comunicação e Política, ocorrido na Universidade Federal da Bahia
– Salvador-BA.
Barbosa, Marialva (2009). Comunicação e história: presente e passado em atos narrativos. Comunicação, mídia e consumo. São Paulo: vol. 6, n. 16.
Bobbitt, David (2011). Teaching McLuhan: Understanding Understanding Media. Enculturation. University of Texas. December 30. Disponível em http://enculturation.net/teaching-mcluhan (consulta em 2015 janeiro 01).
Briggs, Asa; Burke, Peter (2006). Uma história social da mídia: De Gutenberg à Internet. Rio de Janeiro, Jorge Zahar.
Castells, Manuel (2005). Internet e Sociedade em Rede. Em Morae, Dênis (org.) Por uma outra comunicação – mídia, mundialização cultural e poder. Rio de Janeiro, São Paulo, Record.
Capentier, Nico (2012). The concept of participation. If they have access and interact, do they really participate? Fronteiras - estudos midiáticos. Vol. 14 Nº 2 - maio/agosto.
Instituto Brasileiro De Geografia E Estatística – IBGE (2016). Acesso à Internet e à televisão e posse de telefone móvel celular para uso pessoal 2016: PNAD contínua. Disponível em https:// agenciadenoticias.ibge.gov.br/media/com_mediaibge/arquivos/ c62c9d551093e4b8e9d9810a6d3bafff.pdf (consulta em 2018, agosto 15).
Jenkins, Henry (2009). Cultura da Convergência, São Paulo, Aleph.
McLuhan, Marshal (2007). Os meios de comunicação: como extensões do homem, São Paulo, Editora Cultrix.
Palácios, Marcos (2014). Memória: Jornalismo, memória e história na era digital. Em Canavilhas, João (org.) Webjornalismo – 7 características que marcam a diferença. Covilhã: Livros LabCom.
Pereira, Vinicius Andrade (2004). As tecnologias de Comunicação como gramáticas: meio, conteúdo e mensagem na obra de M. McLuhan. Contracampo (UFF), Niteroi - RJ, v. 10/11, p. 07-20.
Primo, Alex (2005). Para além da emissão sonora: as interações no podcasting. Intexto, Porto Alegre, n. 13. Disponível em http://seer. ufrgs.br/index.php/intexto/article/view/4210 (consulta em 2018, agosto 15)
Ribeiro, Murian (2010). Construção da Informação na Internet e em Sites de Redes Sociais: A Nova Forma de Visão da Informação. XXXIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Caxias do Sul, RS – 2 a 6 de setembro.