Espacio Abierto Cuaderno Venezolano de Sociología Vol.26 No.2 (abril - junio, 2017): 145-172


Viagens arriscadas: percepção de medo e gestão coercitiva de vítimas de roubos a ônibus interurbanos

Eduardo Paes-Machado* y Sílvia Inoue-Viodres**


Resumo

Este trabalho discute a percepção de medo e a gestão coercitiva de vítimas de roubos a ônibus interurbanos no estado da Bahia, Brasil. Analisa entrevistas com rodoviários e passageiros, e matérias jornalísticas. Compara a vitimização por roubos efetuados na própria estrada com a dos roubos em que os ônibus são desviados do seu percurso. Aborda as relações entre a percepção de medo, as características dos veículos, a multiplicidade de vítimas e a duração dos roubos. Destaca variações importantes na percepção da violência psicológica e física de acordo com o estilo de gestão dos assaltantes e as respostas dos motoristas e passageiros nas diferentes fases da transação coercitiva. Conclui defendendo a urgência do Estado exercer sua autoridade regulatória sobre esses crimes para garantir a segurança do transporte público interurbano.

Palavras-chave: Percepção de medo; Gestão coercitiva; Roubos; ônibus; Rotas interurbanas.


Aceptado: 14-08-2016 / Recibido: 03-03-2017


* Universidade Federal da Bahia. Brasil.

E-mail: epaesm@gmail.com

** Universidade Católica de Santos. São Paulo, Brasil.


Risky trips: perception of fear and coercive management of victims of intercity bus robberies


Abstract

Drawing on interviews with drivers and passengers, this article discusses the perception of fear and management of victims of intercity bus robberies. It compares the victimization that takes place during bus robberies on highways and where buses are diverted off route. It addresses the relationship between perception of fear, the vehicle characteristics, multiplicity of victims, and duration of robbery. The article highlights important variations in the perception of violence according to the robbers’ victim management style as well as to the roles of and responses by drivers and passengers in the different phases of the coercive process. It concludes by arguing that it is urgent for the state to exercise its regulatory authority over these crimes and to guarantee security in bus transport.

Keywords: Perception of fear; Handle coercive; Thefts; Buses; Routes interurbanas.


Viajes arriesgados: percepción de miedo y manejo coercitivo de victimas de robos en buses interurbanos


Resumen

Este trabajo discute la percepción de miedo y el manejo coercitivo de las víctimas de robos en autobuses interurbanos en el estado de Bahía, Brasil. Analiza entrevistas con choferes y pasajeros, y reseñas de prensa. Compara la victimización por robos efectuados en la propia carretera con la de los robos en los cuales los autobuses son desviados de su recorrido. Aborda las relaciones entre la percepción de miedo, las características de los vehículos, la multiplicidad de víctimas y la duración de



los robos. Destaca variaciones importantes en la percepción de la violencia psicológica y física en consonancia con el estilo de gestión de los asaltantes y las respuestas de los conductores y pasajeros en las diferentes fases de la transacción coercitiva. Concluye defendiendo la urgencia del Estado ejercer su autoridad regulatoria sobre esos crímenes para garantizar la seguridad del transporte público interurbano.

Palabras clave: Percepción de miedo; Manejo coercitivo; Robos; Autobuses; Rutas interurbanas


Introdução

Conquanto o crime de roubo tenha declinado de modo significativo, a exemplo de outros delitos violentos, no Reino Unido e nos Estados Unidos (Blumstein e Wallman, 2006; Zimring, 2007), ele continua em ascensão em outras regiões do mundo. Este é o caso de países da África (Roitman, 2004) e América Latina (ver Ágel, 2013 e Perú 21, 2010) onde, entre várias formas inéditas de roubo, estão os ataques a ônibus de passageiros que influenciam nas condições de mobilidade da população, nas operações das empresas de transporte e no bem-estar de tripulantes e usuários. Entretanto, apesar do seu caráter cotidiano, disseminado e dos elevados impactos sobre o transporte público, tais ataques predatórios, todavia, não mereceram atenção dos estudiosos.

Ora, o balanço da vasta literatura acerca desse delito predatório mostra três perspectivas de estudo (McCluskey, 2013): as tipologias de roubos (a exemplo de Normandeau, 1968), as características dos indivíduos que cometem este delito (Gill, 2000; Wright e Decker, 1997, entre outros) e a transação entre vítimas e perpetradores em termos de uso da força, resistência e lesões decorrentes para aquelas (a exemplo de Luckenbill, 1981; Tark e Kleck, 2004). Nesta terceira perspectiva destacam-se, por sua vez, as contribuições teóricas derivadas do interacionismo simbólico (Luckenbill, 1981; Best e Luckenbill, 1982), da escolha racional (Cornish e Clark, 1985; Jacobs, 2012, 2013; Copes et al., 2012) e das atividades rotineiras (Cohen e Felson, 1979; Gill, 2000, 2001). Tendo em vista a abordagem interacionista do roubo como uma transação que requer a participação mútua – de perpetradores e vítimas – para validar seu enquadramento (frame) coercitivo (Luckenbill, 1981), os estudiosos da escolha racional e das atividades rotineiras têm enfatizado os investimentos, as tomadas de decisão e as modalidades de condução dessa ação para impor dano ou forçar a aceitação (compliance) (Tedeschi e Felson, 1994). Ainda que os autores interacionistas tenham chamado atenção para as habilidades necessárias para a viabilização dessa troca social predatória – a exemplo da comunicação efetiva, do caráter convincente do enquadramento e da transmissão bem-sucedida de ameaças de punição conforme a reação dos alvos (Luckenbill, 1981) –, a segunda e a terceira abordagens foram adiante ao propor as noções convergentes de manipulação do medo (Jacobs, 2012, 2013),



de gestão de cenas e circunstâncias (Copes et al., 2012) e de diferenciais de habilidade (Gill, 2000, 2001) para conduzir o processo coercitivo do roubo.

A manipulação do medo visa fomentar essa emoção ou apelar para a sensibilidade para promover a escolha racional das vítimas (Jacobs, 2012, 2013), levando-as a avaliar seus pertences como menos valiosos do que sua integridade física e desistirem de qualquer resistência (Luckenbill, 1981; Wright e Decker, 1997; Jacobs, 2012, 2013; Lindegaard et al., 2015). Trata-se de influenciar na certeza e rapidez da aceitação, tornando mais eficiente a realização da ação mediante ameaças palpáveis como a transmissão da ilusão da morte iminente (Wright e Decker, 1997). Em outros termos, como a manutenção da orientação mútua entre assaltantes e vítimas não pode se basear apenas na coerção, os primeiros devem gerenciar impressões para afetar a definição da situação e obter o que desejam. Nesse sentido, há uma convergência entre preocupações expressivas e instrumentais nos roubos que emergem da produção do medo. A manipulação do medo opera ainda com um gradiente crescente e decrescente de violência psicológica que limita o emprego, no contexto norte-americano analisado pelo autor, da violência física (Jacobs, 2012, 2013).

A gestão de cenas e circunstâncias depende da aprendizagem e da atualização constante de scripts ou esquemas estratégicos para conservar vantagem, prevenir ou reduzir a resistência das vítimas em cada estágio do delito (Copes et al., 2012). Isso significa dizer que, dado o caráter ambíguo e arriscado desse encontro predatório para os atores involucrados, os infratores desenvolvem conhecimentos e táticas específicas para reduzir a incerteza, manter o controle inquestionável da cena (Idem) e garantir o sucesso de suas investidas. Por outro lado, na linha teórica das atividades rotineiras (Cohen e Felson, 1979), Gill (2000,2001) mostrou a importância de considerar não somente a motivação do criminoso, mas também a posse das habilidades (skills) necessárias para a prática de delitos. Operando com a distinção entre assaltantes profissionais e amadores, esse mesmo autor enfatizou a distribuição desigual de habilidades técnicas e gestoras entre ambas as categorias ou tipos polares. Tal variação resulta de diferenças quanto ao repertório de experiências, à motivação para manter o controle da situação, ao preparo para assaltar e à disposição para ameaçar e usar, de modo racional e funcional, a força. Assim, as duas categorias de assaltantes possuem atitudes contrastantes com respeito ao grau de aceitação da força física (Gill, 2000 e 2001), que estão refletidas, deve-se acrescentar, em seus estilos menos ou mais violentos de gestão de vítimas (Letkmann, 1973).

Complementando este foco, o presente artigo analisa os impactos dos métodos e técnicas (Deakin et al, 2007) dos assaltantes nas reações e respostas das vítimas de roubos a ônibus interurbanos. Nesse sentido, indagamos sobre as características e os efeitos do uso da violência psicológica e física, incluindo as performances sobre a percepção de medo, a aceitação e a resistência de tripulantes e passageiros. Afirmamos que o emprego desses tipos de violência é influenciado pelas características dos veículos, pela multiplicidade de vítimas e pela interação prolongada entre estas e os assaltantes. Em termos mais específicos, mostramos que o tipo e o nível de vitimização dependem do estilo de gestão dos assaltantes, dos papéis diferenciados e respostas das vítimas nas diversas etapas do roubo. Além desta introdução, de um breve histórico dos roubos, da descrição do trabalho



de campo e de uma caracterização também sucinta dos autores desse tipo de delito, este artigo tem mais uma seção em que são examinadas as fases da vitimização, seguida pelas reflexões finais.

Breve evolução dos roubos a ônibus em rodovias

Os roubos a ônibus interurbanos têm uma história de quase cinco décadas e vêm se disseminando, ainda que de modo desigual, em muitos estados do Brasil (Viodres-Inoue e Paes-Machado, 2010). As evidências indicam que eles começaram no transporte urbano e interurbanos entre estados e municípios da região Sudeste, a mais desenvolvida do país, e depois se estenderam a outras regiões.

Na atualidade, este delito continua sendo um risco para os passageiros de, ao menos, 22 estados da federação (Polícia Rodoviária Federal, 2010). Por exemplo, em uma pesquisa nacional de vitimização com 3.248 passageiros de ônibus interurbanos, 5,3% declararam ter sido roubados no serviço intermunicipal, 5,8% no interestadual e 4,7% no internacional. Esses índices são cinco vezes mais elevados quando se referem à vitimização de parentes e amigos nos mesmos serviços: 25% sofreram roubos no transporte intermunicipal, 27,2% no interestadual e 28,7% no internacional (Abrati, 2008).

A distribuição nacional dos roubos mostra que estes praticamente desapareceram em São Paulo e Rio de Janeiro, estados pioneiros e campeões desse tipo de delito entre as décadas de 1970 e 1990, mas o índice continua elevado em estados menos desenvolvidos da federação. É assim que Minas Gerais, Bahia, Goiás, Pernambuco, Alagoas, Maranhão e Pará passaram a concentrar, até 2007, a maior parte das ocorrências (Idem). Ainda que esses valores sejam inferiores aos apresentados pelas secretarias estaduais de Segurança Pública, como a da Bahia (SSP-BA, 2007), os dados confirmam a “migração” inter-regional do delito por razões que ainda precisam ser investigadas.

Quanto ao estado da Bahia, que possui a segunda malha rodoviária do país depois de Minas Gerais,1 ele ocupou a liderança dos roubos a ônibus em rodovias entre 2000 e 2006, mas foi ultrapassado por Minas Gerais em 2007, voltando a recuperar o ao primeiro lugar, em termos absolutos, em 2013. Efetivamente, nas rodovias da Bahia houve pelo menos um roubo a cada dois dias entre 2003 e 2007 (Abrati, 2008; PRF, 2010). Duas décadas depois do Rio de Janeiro, a Bahia teve uma onda de roubos a ônibus em rodovias que elevou as taxas desse delito de 4,1%, em 2003, para 6,97%, em 2004, e 6,26%, em 2005, por

1.000 viagens. Nos anos seguintes, entre 2006 e 2007, as taxas caíram para 5,08% e 4,41% respectivamente, mas permaneceram acima do percentual inicial da série. Conquanto a falta de informação acerca do número de viagens interestaduais tenha impossibilitado o cálculo de taxas entre 2008 e 2013, os números absolutos2 evidenciam a ocorrência de


1 O estado da Bahia possui 53 empresas concessionárias e permissionárias que exploram 1.357 linhas de transporte e empregam 18 mil rodoviários interestaduais e intermunicipais. Tais empresas transportaram, em 2007, 1.454.003 passageiros em 57.202 viagens intermunicipais e interestaduais (Agerba, 2014).

2 O número de roubos nesse período foi: 425, em 2008; 604, em 2009; 463, em 2010; 464, em 2011; 480, em

2012; 524, em 2013 (SSP, 2014).



mais de um roubo a ônibus por dia nesse período. Por sua vez, a multiplicação desses números de assaltos anuais pelo número médio de passageiros por veículo (34)3 mostra que somente em 2013, ano em que ocorreram 524 eventos, foram roubados 17.816 passageiros. Apesar disso, o imperativo da necessidade juntamente com a atenuação da percepção de risco - ocasionada pela diminuição da cobertura da mídia e as medidas paliativas das viagens em comboios e das escoltas armadas -, continuam levando esses e outros passageiros a serem vítimas de tais roubos.


Trabalho de campo

Para este estudo qualitativo foram conduzidas 45 entrevistas semiestruturadas

- 30 com rodoviários e 15 com passageiros - visando o aprofundamento de um estudo anterior sobre o mesmo tema (Viodres-Inoue e Paes-Machado, 2010). Estas entrevistas foram realizadas entre fevereiro e dezembro de 2015. O critério da saturação de dados foi utilizado para definir a quantidade de participantes e, no caso dos motoristas, o número de empresas de transporte.

A amostra foi composta por rodoviários convidados a participar do estudo por abordagem casual, indicação de pessoas chaves ou por outros rodoviários que já haviam sido entrevistados. Com respeito às abordagens casuais, um dos assistentes de pesquisa escolheu uma empresa de ônibus para contatar e entrevistar oito motoristas que por ali transitavam diariamente. Em relação à pessoa chave, um segundo assistente de pesquisa procurou um vizinho que também era motorista de ônibus para também estabelecer contato e entrevistar vinte e dois colegas e conhecidos da sua empresa e de outras empresas de transporte. Essas entrevistas foram realizadas em seis empresas de ônibus de Salvador. Os 30 rodoviários eram do sexo masculino e tinham idade mínima de 25 e máxima de 52 anos (mediana de 42 anos). Eles possuíam nível médio completo e incompleto de escolaridade. O seu tempo de serviço variou entre de 5 a 20 anos (mediana de 12 anos). Todos haviam sido roubados na condução dos ônibus. Enquanto vinte e cinco entrevistas transcorreram nas portarias, garagens das empresas e no interior dos ônibus nestas estacionados, cinco foram feitas nas residências dos rodoviários, nos finais de semana, por impossibilidade de conseguir uma brecha no horário de serviços dos mesmos. Os eixos das entrevistas foram: a forma de roubo, o processo coercitivo e as ações e reações de vítimas e infratores. Elas duraram de 20 a 45 minutos cada.

Os quinze passageiros foram selecionados entre contatos pessoais dos pesquisadores e estudantes universitários ou através de buscas na internet para posterior realização de entrevistas presenciais em cafés e locais públicos. Todos eles foram vítimas de roubos enquanto viajavam com uma média de trinta outros passageiros como sói acontecer nessas viagens de ônibus. Em contraste com os motoristas, quase todos eram, com exceção de três passageiros, mulheres. Vários dentre eles possuíam nível universitário ou estavam cursando uma faculdade. A idade mínima era de 23 e a máxima de 52 anos (mediana de 35


  1. A média calculada segue as recomendações da Agerba (Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos de Energia, Transporte e Comunições da Bahia), em contato pessoal efetuado em maio de 2014.



    anos). Os eixos das entrevistas também foram a forma de roubo, o processo coercitivo e as ações e reações de vítimas e infratores. A duração variou de 36 a 45 minutos.

    Os dados foram analisados a partir da codificação e formulação de registros. As categorias foram construídas de modo processual, agregando códigos correlacionados, definindo temas e subtemas que possibilitassem o reconhecimento de padrões e conexões (Emerson; Fretz; Shaw, 1983).


    Um esboço dos assaltantes de estrada

    Os assaltantes atuam nos acessos e nas proximidades de cidades e povoados do estado, ou por falta de outras oportunidades ilícitas (Cloward e Ohlin, 1960) ou por não quererem ser identificados em seus locais de moradia (Viodres-Inoue e Paes-Machado, 2010). A mola propulsora do seu empreendimento ilegal e violento (Hobbs, 1988; Volkov, 2002) é o fornecimento de mercadorias roubadas para consumidores, comerciantes e outros agentes que buscam reduzir custos ou acumular capital pelo agenciamento da força (Zaluar, 1994; Paes-Machado e Riccio-Oliveira, 2009; Telles, 2010). Assim, dada a gama de bens valorizados – dinheiro, equipamentos eletrônicos, relógios, joias, roupas e calçados de marca, etc. –, essas redes de receptadores contribuem para definir os métodos e técnicas específicas para roubá-los (Deakin et al., 2007).

    As poucas evidências disponíveis mostram que esses assaltantes são heterogêneos quanto à organização, ao número de pessoas envolvidas nas operações, ao profissionalismo e aos tipos de armas e meios de transporte (Viodres-Inoue e Paes-Machado, 2010). De um lado, tem as duplas ou trios de assaltantes avulsos – “pés de chinelo” na nomenclatura policial – com características sociodemográficas semelhantes às dos assaltantes de ônibus urbanos: jovens do sexo masculino e negros (Paes-Machado e Levenstein, 2004). De outro, estão as quadrilhas que agregam quatro, cinco ou mais integrantes. Tais quadrilhas, por sua vez, são diferenciadas em termos de grau de cooperação técnica e habilidades gestoras (Aquino e Sá, 2014; Gill, 2000; 2001; Letkmann, 1973). A cooperação técnica nas quadrilhas profissionais envolve o planejamento das ações por meio da coleta, transmissão e processamento de informações acerca de percursos, horários, poder aquisitivo dos passageiros e condições de vigilância dos veículos. Quanto às habilidades gestoras, as equipes profissionais demonstram mais competência para conduzir os assaltos e minimizar o uso da violência física contra as vítimas do que as equipes de amadores e os assaltantes avulsos. Em contraste com os avulsos que portam facas, facões, revólveres 38 (e até velhas espingardas de caça) e deslocam-se em carros velhos, motocicletas, animais de carga e mesmo a pé, as quadrilhas possuem escopetas, metralhadoras e carros mais novos.



    De modo geral, os assaltantes avulsos e as quadrilhas menos profissionais (Matthews, 2002) direcionam suas ações para roubos a ônibus – comerciais e executivos4 - na própria estrada; as quadrilhas profissionais, por sua vez, roubam, na maior parte das vezes à noite e de madrugada, veículos executivos mediante o desvio de percurso, confinamento e saque dos tripulantes e passageiros. Tanto uns como os outros se aproveitam do seu conhecimento das vantagens ecológicas (St. Jean, 2007) da malha rodoviária, como trechos isolados, desvios, atalhos, etc., para atacar, parar ou desviar os ônibus. Tais vantagens são maximizadas pela inexistência de sinal de celular, que poderia proteger tripulantes e passageiros na maior parte das rodovias. Ademais, a dificuldade de policiamento das estradas e a falta de autoridade regulatória estatal (Roitman, 2004) – expressada na inoperância e mesmo cumplicidade de agentes públicos locais – favorecem os delitos.


    Fases da vitimização

    A vitimização por roubos a ônibus implica em tarefas específicas conjuntas para assaltantes e vítimas e desenvolve-se em cinco fases distintas, mas parcialmente sobrepostas, a saber: (a) captura do veículo; (b) compartilhamento da definição de situação de roubo entre assaltantes e motoristas; (c) compartilhamento da definição de situação de roubo entre assaltantes e passageiros; (d) pilhagem; (e) libertação.


    Captura do veículo

    Após serem selecionados, os ônibus são abordados por assaltantes posicionados em lugares e momentos adequados para capturá-los mediante táticas violentas ou não. As táticas não violentas compreendem a simulação da aparência de normalidade (Jacob, 2012, 2013) pelo ingresso de assaltantes embarcados como passageiros e falsas operações policiais, bem como os bloqueios das vias. Por sua vez, as táticas violentas envolvem ataques rápidos e repentinos (blitzes) (Jacobs, 2013) contra os veículos. Ao mesmo tempo que tais ataques amplificam a violência física e psicológica no momento que precede ou acompanha o estabelecimento da copresença, eles influenciam a percepção de medo dos motoristas e dos passageiros acordados dentro do ônibus.

    A infiltração dos ônibus por assaltantes embarcados como passageiros (Paes-Machado e Levenstein, 2004) é uma forma de simulação ou gestão da normalidade que visa reduzir a distância em relação ao alvo sem alertá-lo prematuramente, nem levá-lo a impedir o encontro coercitivo (Jacobs, 2012, 2013; Copes et al., 2012 ). Essa ilusão é criada pelo ingresso no veículo de assaltantes sozinhos, em duplas ou trios, às vezes acompanhados por mulheres e crianças, como usuários comuns, quando na verdade buscam melhores


  2. Os veículos são classificados em comerciais e executivos. Os primeiros, conhecidos como pinga-pinga pelas constantes paradas para embarque e desembarque, realizam viagens diurnas, são menos confortáveis e mais baratos que os ônibus executivos. Estes últimos, por sua vez, raramente param fora das estações rodoviárias e dos pontos de apoio das empresas e oferecem viagens em horários noturnos. Enquanto os veículos comerciais estão mais expostos à infiltração por falsos passageiros nos pontos de embarque e desembarque, os executivos tendem a ser capturados por meio do bloqueio das vias e de ataques rápidos.



    oportunidades para agir (Copes et al., 2012). Uma vez no ônibus, eles procuram poltronas que dão maior visibilidade, verificam a presença de policiais ou vigilantes e aguardam o momento e o lugar certos para o anúncio do assalto. Se nos roubos consumados na própria estrada os assaltantes recolhem rapidamente os pertences dos tripulantes e passageiros e fogem (Paes-Machado e Levenstein, 2004), nos roubos com desvio do veículo, que demandam mão de obra adicional, outros comparsas embarcam posteriormente ou aguardam no trecho combinado para pará-lo ou desviá-lo e também roubar o conteúdo dos bagageiros (motorista, 35 anos).

    A segunda forma de simulação de normalidade são as falsas operações policiais.5 Trata-se de uma tática ousada, mas pouco frequente, em especial na Bahia, por talvez demandar equipamentos expressivos padronizados (Goffman, 1975) e escassos, como viaturas e uniformes. A credibilidade dos elementos da encenação – homens fardados, falsa viatura policial etc. – garante que a captura do veículo não seja desafiada. Tal como os falsos passageiros, a eficácia dessa técnica está fundada em uma ação falaciosa, em que se blefa com o processamento esquemático dos alvos e se ganha tempo com a promoção do equívoco de avaliação (Paes-Machado e Nascimento, 2014).

    Entre essas técnicas de simulação da normalidade e os ataques rápidos e repentinos há o bloqueio de trechos em que a cobertura da rodovia é satisfatória ou em trechos esburacados e vias sem pavimentação. As barreiras mais utilizadas são troncos de árvore, pedras, objetos perfurocortantes e veículos: “Eu estava trafegando na estrada... os bandidos colocaram pedaços de madeira, troncos grandes de árvore na estrada, quando dei por mim, já estava em cima, era de noite; quando freei, quatro bandidos surgiram do meio do mato anunciando assalto” (motorista, 52 anos). Trata-se de fazer o motorista frear o veículo e ficar ao alcance de infratores que aguardam, emboscados nas margens da estrada, a oportunidade para rendê-lo. Os assaltantes também espalham na estrada objetos perfurocortantes, chamados de miguelito ou pé de galinha, para furar os pneus dos ônibus (motorista, 32 anos). O bloqueio ainda pode ser efetuado com veículos pequenos ou grandes. É o que sucede nos roubos “casados” ou em cadeia, em que carretas ou ônibus já tomados para saque são empregados para bloquear outros ônibus.6 Esta forma de bloqueio atingiu até veículos que viajavam, por medida de segurança, em comboio (Folha de S. Paulo, 20/5/2004). Em certos casos, enquanto os passageiros permanecem


  3. Falsas operações policiais ocorreram na Bahia na primeira onda registrada de crimes (Folha de S. Paulo, 20/5/2004). No estado do Paraná, por sua vez, em 2003, seis homens vestidos de policiais militares e com um veículo com distintivo roubaram R$30 mil de um grupo de sacoleiros que viajava na linha Mogi das Cruzes-Foz de Iguaçu (Folha de S. Paulo, 21/10/2003).

  4. Em 2003, um motorista que tentou furar um bloqueio, feito com duas carretas, no sudoeste do Paraná foi baleado por assaltantes (Francisco, 2003).



    confinados nos desvios das rodovias, outros ônibus são parados para igualmente serem

    saqueados (Francisco, 2003).7

    Os ataques rápidos e repentinos são mais ameaçadores (Jacobs, 2013) e, em certas circunstâncias, também mais visíveis do que as táticas de simulação da normalidade e bloqueio das vias. A forma desses ataques varia conforme a velocidade do ônibus. Nos momentos de baixa velocidade ou parada do veículo no acostamento da estrada, o motorista fica ao alcance e pode ser facilmente rendido por assaltantes posicionados nas margens ou no meio da pista: “Quando cheguei às proximidades de Ipirá, um colega que saiu em comboio comigo, na frente, parou no acostamento. Ele parou, encostei-me ao fundo e parei. Foi quando fui rendido por três elementos que já tinham assaltado ele. Eles entraram com muita violência. Apontaram as armas e eu abri” (motorista, 27 anos).

    Nos momentos de maior velocidade, os assaltantes utilizam objetos contundentes e automóveis para capturar o veículo. Por mais rudimentar que pareça, o arremesso de pedras e até de cocos no para-brisa dos ônibus (Polícia Rodoviária Federal, 2010) é uma técnica empregada nos ataques. Contudo, a depender da velocidade do ônibus, do ângulo de lançamento e da pontaria, as pedras podem errar o alvo, dando chances ao motorista para escapar (Felson, 2006; Paes-Machado e Riccio-Oliveira, 2010).

    Mais ágil e eficiente do que o arremesso de pedras é a interceptação dos ônibus por meio de carros (motorista, 37 anos). Para isto, os carros seguem, encostam, dão fechadas e cortadas, se jogam contra o ônibus ou bloqueiam a estrada para forçar o motorista a parar: “os ladrões chegaram por trás em um carro, era de noite (...) Esse caras vieram com tudo, deram uma fechada, freei, a frente do ônibus chegou a bater ainda no fundo do carro deles, eles desceram com armas na mão e mandaram abrir a porta” (motorista, 32 anos). Em outros casos, ao lado dessas manobras arriscadas, que nem sempre são logo percebidas pelos motoristas como ataques,8 os assaltantes sinalizam, mostram ou disparam suas armas para o ar ou contra os pneus ou o para-brisa para não deixarem dúvidas sobre seus propósitos:

    Estava em uma velocidade considerável, não dava pra parar de imediato, eles tentaram fazer umas cortadas pra poder entrar na minha frente, de inicio eu pensei que era mais um doido na estrada, tentei desviar o tempo todo, só percebi que se tratava de um assalto na hora que eles atiraram no ônibus e fizeram sinal pra parar, foi aí que eu parei (motorista, 40 anos).


  5. “No segundo assalto sofrido pelo motorista A. (44 anos), às 00hs30, seis pessoas armadas pararam o ônibus no quebra-molas e o conduziram para o matagal. O motorista ficou no seu assento e foi poupado, os passageiros foram revistados. Usavam máscaras, comentaram que em seguida viria um ônibus da mesma empresa que também seria saqueado. Parte do bando ficou e o restante foi abordar o outro veículo. Os assaltantes que saíram trouxeram o outro ônibus e repetiram o procedimento. O confinamento só foi encerrado às cinco da manhã” (Inoue-Viodres e Paes-Machado, 2010, p. 21-22).

  6. “Na hora assim [em que os assaltantes jogavam o carro deles contra o ônibus] ... eu não percebi. Só depois que a ficha foi caindo, as insistências deles me levaram a achar que eram bandidos. Situações como essas nas estradas tem cara de assalto” (motorista, 37 anos).



    Acontece que mesmo sob o fogo de disparos há motoristas que utilizam o ônibus, como arma e escudo (Jacobs, 2012, 2013) para atropelar assaltantes e se proteger dos tiros (Inoue-Viodres e Paes-Machado, 2010). Isto leva os infratores a efetuarem novos disparos (Folha de S. Paulo, 7/1/1987, 24/11/2007) que podem redundar, nesta fase inicial de estabelecimento da copresença, em desfechos desastrosos (Linger, 1992) para o veículo e seus ocupantes:


    Na madrugada acordamos com um barulho seguido que parecia peças se soltando do ônibus e em meio a gritos ouvi meus colegas falarem: ‘É tiro na direção do ônibus!’. O motorista aumentou a velocidade, eram dois carros com quatro homens, tinham sinalizado para o motorista parar, como não parou e começaram a atirar. O motorista acelerou, não conseguiu se livrar deles até que capotou duas vezes em uma ribanceira e ficou com as rodas para cima (lojista, 52 anos).

    Em suma, se várias táticas não violentas adiam por algum tempo o compartilhamento da definição de situação de roubo, os ataques deixam claras, desde o início, as intenções dos infratores (Jacobs, 2013) ou antecipam este compartilhamento. Daí sua importância para a obtenção, nesta fase inicial (the onset) e crítica do encontro predatório (Lindegaard et al., 2015; Copes et al., 2012), da aceitação dos motoristas.


    Compartilhamento da definição de situação de roubo entre

    assaltantes e motoristas

    O compartilhamento da definição de situação de roubo será bem-sucedido quando os motoristas demonstrarem que perceberam o que está em jogo e entenderam seu papel no evento (Copes et al., 2012). Conquanto o uso da violência física esteja muito presente, a violência psicológica para aumentar o medo é a mais mencionada pelo sujeitos.

    Após pararem o ônibus, os infratores aparecem disparando para o ar ou apontando suas armas para o rodoviário abrir a porta e eles adentrarem no veículo. Trata-se de fazê- lo compreender o objetivo da ação e o risco de resistência, transmitindo a ideia de que a morte é iminente (Wright e Decker, 1997; Copes et al., 2012):


    Eram cinco bandidos, todos armados, era de noite, e eles desceram do carro correndo e apontaram as armas para mim e mandaram que eu abrisse a porta, eles começaram a forçar; aí eu tive que abrir, eles entraram ... Tirei a mão do volante pra eles não pensarem que eu iria reagir ou fazer algo errado, fiquei calmo; eles falaram que era um assalto, mandaram eu abrir a porta do meio, eles foram lá pro fundo pra assaltar os passageiros; depois mandaram eu sair da estrada (motorista, 42 anos).

    Se os gestos de ameaçar e forçar o motorista a abrir a porta do veículo ou demonstrar aceitação das condições impostas, parecem suficientes aqui para satisfazer os infratores, em certas situações, em que os rodoviários resistiram a parar o veículo na fase da captura, a explicitação da situação de roubo se desdobra em tapas e coronhadas, mostrando que



    a punição dos recalcitrantes pode tardar mas termina acontecendo: “Um dos assaltantes me deu um tapa na nuca no momento do assalto. Eu estava descendo a escada do ônibus, quando recebi o tapa pelo meio do pescoço; ele ainda falou esse filho de uma puta não quis parar pra nós, deveríamos dá um bocado de tiros na cara dele” (motorista, 40 anos). Em contraste, há compartilhamentos em que os infratores buscam a tranquilização: “Ah... eles mandavam eu ficar tranquilo, que ninguém iria fazer nada com ninguém, que era pra seguir as ordens deles que tudo sairia bem” (motorista, 52 anos).

    Permeando a recepção da mensagem transmitida pela arma de fogo, o conhecimento acumulado, direto ou indireto, dos rodoviários torna-os cientes das técnicas delituosas.9 Entre outras coisas, aprenderam que os assaltantes de estrada estão dispostos a tudo para lograrem suas metas: “Eles batem, xingam, empurram [...]. Eles não liberam nada. Se você der um vacilo, eles batem mesmo” (motorista, 45 anos). Também aprenderam a reconhecer as diferenças de habilidade (Gill, 2000 e 2001) gestora entre assaltantes “inexperientes” e “profissionais do crime”. Enquanto os primeiros são definidos como jovens, nervosos (ou agindo sob a influência de drogas) e violentos,10 os “profissionais” caracterizam-se pela frieza e polidez no trato (Paes-Machado e Nascimento, 2011). Associado a isto, os profissionais se destacam por sua competência para manipular a psicologia da vítima: Do jeito que eles agiam, na tranquilidade, era de quem trabalhava com isso. Sabem mexer com o psicológico da pessoa” (motorista, 43 anos). Por isso mesmo, os rodoviários sentem-se mais seguros e, certamente, dispostos a cooperar nos roubos conduzidos por estes últimos do que nos ataques cometidos pelos inexperientes: “Quando é um assalto dessa maneira [profissional] não é bom, porque a gente não sabe o que está acontecendo lá dentro [na ala dos passageiros]. Porém dá mais segurança pra gente” (motorista, 45 anos). Ou seja, diferente do estilo espasmódico e truculento dos amadores, a gestão de vítimas (Letkmann, 1973) pelos profissionais é mais comedida no uso da força para a promoção do medo, apostando na resiliência, preservando o potencial cognitivo e alargando a margem de colaboração dos assaltados.

    Embora a meta sejam os pertences dos passageiros, o rodoviário percebe-se como o alvo principal da ação, não só por ser o responsável pelo veículo – “o ônibus está comigo, então eu sou o alvo” (motorista, 35 anos) –, mas também por passar mais tempo sob a mira da arma (motorista, 42 anos). A ação coercitiva se manifesta, neste ponto, em uma performance curta e grossa de inversão do papel de autoridade: aquele que até então era o condutor passa a ser conduzido, perde sua posição de comando e é forçado a tomar o lugar de comandado (Paes-Machado e Levenstein, 2004): “Tentamos manter a calma, mesmo diante da situação. Eu tento passar para o indivíduo que ele é o dono da situação. Eu falo:


  7. “Os locais de maior insegurança a gente sempre fica sabendo; um colega quando fica sabendo que naquela localidade da estrada vem acontecendo assaltos ou quando sofre um assalto, essa informação é repassada para os demais, pra que a gente fique ligado, comece a se prevenir. Mas é muito complicado, mesmo com essa informação os bandidos sempre arrumam uma nova forma pra roubar. Cada vez mais eles estão mudando de estratégias para roubar os ônibus” (motorista, 44 anos).

  8. Ainda segundo este mesmo entrevistado: “A reação da gente é de nervosismo, medo. A gente vê, sente muito a inexperiência deles [dos amadores], aquele nervosismo, fica só imaginando os gestos deles... podem atirar” (motorista, 45 anos).



    ‘estou para fazer o que você quiser, só não me machuque’. Dizemos que temos família e tal. Transmitimos que ele está no controle da situação” (motorista, 27 anos). O próximo passo é executar as tarefas esperadas e ser uma espécie de coorientador na dinâmica grupal de vitimização, entrando em cena com as atuações necessárias e o repertório de condutas assertivas. Além de franquear o acesso dos infratores ao interior do ônibus, estas tarefas incluem, no caso dos roubos com desvio de percurso, a condução do veículo (motorista, 35 anos) e a abertura do bagageiro.

    Ademais, os motoristas temem catástrofes potenciais (Copes et al., 2012) ou desfechos desastrosos (Linger, 1992) provocados por incompreensões mútuas e ações imprevisíveis. Se estas possibilidades estão presentes nos roubos ordinários de um ou poucos indivíduos (Copes et al., 2012), o que dizer acerca de roubos inéditos como estes que atingem simultaneamente uma média de trinta pessoas de cada vez?: “Eles [os assaltantes] avisam: ‘Olha, se fizer qualquer gracinha eu mato todo mundo’. Então você fica naquela tensão, para que ninguém faça nada” (motorista, 32 anos). Na espiral de violência observada nesses roubos e nas táticas de combate (Paes-Machado e Levenstein, 2004), passageiros armados, em especial policiais contratados ou não como vigilantes pelas empresas, efetuam disparos que provocam ferimentos e mortes de infratores, outros ocupantes do veículo e dos próprios policiais (motorista, 27 anos).

    Enfim, em contraste com empregados vítimas de roubo a banco, que são tratados como estorvos a serem removidos ou neutralizados pelos assaltantes (Einstadter, 1966), a participação dos motoristas rodoviários é fundamental, e não é à toa que eles se percebem como o alvo principal da violência física e psicológica nessa etapa.


    Compartilhamento da definição de situação de roubo entre

    assaltantes e passageiros

    Em muitos roubos, depois do estabelecimento da coorientação entre os assaltantes e o motorista, os primeiros viram a página do script (Copes et al., 2012) para incluir e tornar os passageiros protagonistas de uma cena da vitimização. Sem excluir a violência física, essa cena compreende a amplificação da coação psicológica contra eles, em especial, nos encontros predatórios que envolvem o desvio de percurso do veículo e o confinamento de seus ocupantes.

    Devido à porta divisória da cabine do motorista, é comum os passageiros não se darem conta do que está acontecendo; às vezes estão simplesmente dormindo (Folha de

    S. Paulo, 24/5/1985, 14/12/1988). Para assegurar que todos entendam a situação (Copes et al., 2012), parte dos assaltantes ingressa com armas em punho na ala dos passageiros. É o momento de todos saberem, por um ato de simplificação cognitiva, típico de algumas performances (Alexander, 2004), que são o alvo da ação coercitiva: “Isto aqui é um assalto!”, brada alguns dos prepostos, xingando e, às vezes, distribuindo tapas nos mais sonolentos e atirando no piso do veículo. A linguagem intimidadora dramatiza, de modo inequívoco, a conversão repentina e irreversível da situação em um crime (Katz, 1988). Os passageiros são transportados para o pesadelo da opressiva situação de assalto, quando



    também podem esboçar reações mal recebidas pelos infratores. “É a hora do espanto, da gritaria e do pânico” (lojista, 52 anos). Ainda que a descarga de adrenalina provoque sensações de perda de controle sobre o corpo e a voz, algumas vítimas se esforçam para manter a calma (torneiro mecânico, 45 anos).

    Efetivamente, como descargas emocionais se opõem à ideia de controle inquestionável da cena (Copes et al., 2012), os assaltantes pedem ou ameaçam os presentes para se calarem, manifestando suas intenções e prometendo castigo para os recalcitrantes: “Eles ficavam falando um monte de coisa, que era pra não tentar nada, ficar calmo, que eles não queriam fazer nada de mal com ninguém, que eles queriam era dinheiro, e que era pra ninguém esconder nada, pois se eles percebessem seria pior pra todos” (motorista, 42 anos). Intensificam também a pressão sobre um ou outro tripulante ou passageiro para conter a inquietação reinante: “O cara [o assaltante] chegou falando que era assalto, aí ele mandou ficar com a mão na cabeça e os olhos fechados. Uma moça nervosa, ela ficava tremendo o olho sem conseguir fechar, e ele [o assaltante falando] ‘você tá me olhando?’” (professora, 33 anos).

    Com ou sem panos amarrados no rosto, máscaras ou capuzes, os infratores costumam ordenar que os passageiros não olhem para eles ou fiquem de cabeça baixa. De um lado, as máscaras, assim como a destruição de câmeras internas de filmagem, viabilizam o anonimato (Huggins et al., 2006), dificultando identificações e reconhecimentos: “[Os] cinco assaltantes falavam pouco, estavam todos mascarados, não dava nem pra ver a cor da pele deles, estavam de casaco, uns de camisa amarrada [no rosto], outros de brucutu, pareciam pessoas da roça, bem de interior” (professora, 33 anos). De outro, a proibição de olhar para os perpetradores restringe o campo de percepção da vítima, impossibilitando-a de se orientar. A ordem de abaixar a cabeça, por seu turno, é um gesto despótico que reforça a hierarquia do mando e da obediência, mostrando quem tem o poder para controlar e punir.

    Outrossim, a suspeita de que os assaltantes possam estar drogados contribui para aumentar o medo. A aparente ausência de racionalidade gera tanto pavor que as vítimas se submetem a qualquer coisa, pois não têm ideia do que pode acontecer. Mas, para evitar que esta conduta expressiva comprometa a orientação racional-instrumental do roubo, ela é refreada, em várias equipes, por parceiros equilibrados (motorista, 49 anos). Daí, o nexo de complementaridade entre essas posturas e a produção de efeitos desejados nos assaltados. Ao tempo que estes temem ser agredidos por uns, eles se identificam psicologicamente com os outros, comprometendo-se com as metas do grupo (Paes- Machado e Nascimento, 2011).

    Contudo, como nem sempre a encenação toda impede que alguns passageiros percam o controle, tendo crises de choro, segurando seus pertences etc., eles são punidos. Com isso, estabelece-se uma espécie de pacto psicológico que é a essência mesma da transação coercitiva: se não houver oposição, todos ficarão ilesos, caso contrário, serão mortos ou machucados. Tal pacto, entretanto, não é fixo. Ele é constantemente renovado pela reiteração das ameaças seguida por demonstrações de aceitação. Dado o caráter incerto do encontro predatório (Copes et al., 2012), o sucesso deste depende, em boa parte, dessa



    intermitência de estímulos e reforço para promover a sensação de medo (Jacobs, 2013) e dificultar a retomada de agência das vítimas: “[Eles faziam ameaças] pra que ninguém reagisse mesmo, esses caras ficam com medo de alguém tentar alguma coisa, de ter algum passageiro armado. É uma incerteza, eles não sabem no que vai dá o assalto. Pode dá certo ou não” (motorista, 41 anos). Afora isso, pode-se supor que tais ameaças intermitentes operam como lembretes para os assaltantes permanecerem alertas aos desafios cambiantes da transação coercitiva.

    Simultaneamente, os infratores fazem a triagem das vítimas. Passageiros do sexo masculino são inspecionados e podem ser, caso pareçam policiais, agredidos para confessarem sua identidade profissional. Quando isso é constatado, eles são imobilizados ou desarmados. Mais uma vez, o caráter transgressivo desse delito de contato direto entre infratores e múltiplas vítimas se expressa em uma performance de inversão dos papéis de autoridade. Tal exibição envolve a apropriação jocosa e simbólica das insígnias e das prerrogativas daqueles que deveriam ser objeto de deferência de todos e de temor, da parte dos infratores: “eles renderam primeiramente o policial, tomaram a farda, o boné e arma que ele portava; aí um deles vestiu a farda, colocou o boné e a arma, e disse: ‘agora eu vou brincar de ser policial, quem manda aqui agora sou eu’” (comerciante, 33 anos). Doravante não há mais nenhum entrave para a concretização do plano.

    Nos roubos sem desvio de itinerário, o enquadramento das vítimas é seguido imediatamente pela tomada efetiva dos bens por um assaltante ou mesmo um passageiro convocado para a tarefa (cobrador, 42 anos). Conquanto esta receita básica e repetida para a manipulação do medo garanta a colaboração da maioria na transferência dos bens (Luckenbill, 1981) para os malfeitores, ela não funciona para alguns passageiros, que podem, consequentemente, ser punidos por resistirem a entregar seus pertences. Enfim, após a limpa, os infratores fogem, abandonando as vítimas em sua rota de viagem: “Anunciaram o assalto, levaram o que deu pra levar, descerem e foram embora andando” (motorista, 44 anos).

    Em contrapartida, os roubos com desvio de percurso demandam mais tempo, critério e encenação, assim como amplificam a apreensão dos passageiros. No trajeto para o cativeiro final, enquanto um assaltante orienta o motorista, outros fazem a segurança do recuo, devendo acionar os parceiros em caso de ameaça. Nas investidas mais complexas ou delicadas, sentinelas (Hallsworth, 2005) próximos da rodovia estão instruídos para usar assovios, sinais de lanternas, fogos de artifício e tiros para o alto para avisar os membros do grupo sobre a aproximação de terceiros. O cuidado não é excesso de zelo; várias empresas de transporte contratam escoltas motorizadas de vigilantes armados para proteger seus



    veículos (Roitman, 2004),11 além do que o deslocamento do ônibus de seu trajeto original já pode ter sido notado por motoristas de carros comuns.

    À medida que o veículo se afasta da rodovia, as vítimas sentem-se mais desamparadas, aumentando a sensação de vulnerabilidade. As estradas de terra, às vezes com barrancos e quase que encobertas pela vegetação silvestre, são um teste para o motorista, que dirige de farol baixo ou luzes apagadas. Passageiros amedrontados desafiam a ordem de permanecer de cabeça baixa, olhando pela janela à espreita de algum sinal de proteção. A escuridão reflete a falta de esperança, pois sabem que nas “margens do Estado” (Das e Poole, 2004) para onde estão sendo levados não há guardiãos capazes de protegê-los (Cohen e Felson, 1979): “Durante a noite [o assalto] é um pouco pior, porque tudo é mais complicado. A sensação de pânico, de terror é um pouco pior. Durante o dia dá a sensação de que você está sendo visto, que alguém esteja vendo e denuncie. Uma esperança...” (motorista, 25 anos). Quando o veículo enfim estaciona, o pânico já tomou conta da situação. Em outras palavras, embora o compartilhamento da definição de situação de roubo esclareça os termos da interação coercitiva, ele deixa em aberto desdobramentos como estes que acontecem nos eventos mais demorados: “Meu coração começou a palpitar forte no momento em que o motorista começou a sair da estrada, a entrar no canavial e parou; aí pensei que eles podiam matar a gente. Não sabia o que eles queriam de fato, até aquele momento tudo era possível, até matar a gente” (funcionário público, 35 anos).


    Pilhagem

    A transferência ou a apropriação de bens, que começa e acompanha o compartilhamento da definição de situação de roubo e, em parte dos casos, termina na estrada, prossegue, nos roubos com desvio de rota, em locais onde os veículos são estacionados e as vítimas ficam ainda mais à mercê das equipes coercitivas gestoras. A percepção de medo durante essa apropriação – que se assemelha, pelas proporções materiais e características performáticas, a uma pilhagem – varia de acordo com o estilo de gestão menos ou mais violento das equipes e as reações dos assaltados.

    Efetivamente, nas clareiras abertas na noite pelas luzes dos ônibus, os membros da equipes se desdobram entre tarefas de vigilância, revista, busca, coleta, triagem, carregamento, acondicionamento e transporte dos bens (estudante, 23 anos). Essas revistas incluem o vasculhamento das poltronas (motorista, 39 anos) e a inspeção dos banheiros em busca de possíveis objetos de valor escondidos pelos passageiros (motorista, 40 anos). A desordem instalada confirma seu poder para dispor dos pertences daqueles que nada podem fazer para impedi-los. Se não deixam nem moedas de lado, pode acontecer de rejeitarem ou fazerem gozação com objetos pouco valiosos, como bijuterias, relógios e celulares antigos, entre outros.12 Além desses pertences que os passageiros carregam


  9. Apesar dos custos financeiros e da dificuldade de operacionalização, a contratação desse serviço tornou- se obrigatória para muitas empresas e um atrativo poderoso para os passageiros. Assim, mesmo quando as empresas suspendem temporariamente as escoltas, elas acabam retomando-as depois de novos ataques. Quanto às empresas que não podem pagar ou implementar tal prática de segurança, elas se restringem a viagens diurnas para evitar assaltos. Tamanha dependência do serviço privado é mais uma confirmação da desregulação da segurança do transporte de ônibus interurbanos ou das próprias condições de possibilidade desses roubos.

  10. Os passageiros também podem tentar persuadir os assaltantes a não tomarem objetos considerados de estimação.



    junto aos seus corpos, os mal feitores se apropriam dos bens transportados nos bagageiros que são o principal atrativo ou la raison d’être dessa modalidade de roubo a ônibus:


    Os pilantras mandaram o motorista abrir o bagageiro e levaram tudo o que eu tinha; eu implorei tanto a eles pra não levaram minhas mercadorias, pois aquilo era um trabalho de uma vida, era todo o dinheiro que estava juntando por meses pra abastecer minha loja, mas eles não tiverem um pingo de pena de mim. Quando lembro do meu prejuízo, sinto um dor no peito (comerciante, 45 anos). 13

    Nas equipes mais estruturadas observa-se uma diferenciação entre funções de comando e execução. Há líderes que acompanham as tarefas, cobrando agilidade dos comparsas e colaboração das vítimas (lojista, 52 anos). Entretanto, a forma de condução dessas revistas e buscas revela diferenças importantes nos estilos de gestão das vítimas (Letkmann, 1973). Em contraposição aos procedimentos mais leves ou toleráveis das equipes profissionais

    –“Eles só ficavam passando a mão nos passageiros, procurando se a pessoa tinha escondido dinheiro ou objeto de valor. Sabe como é? Igual à revista da polícia” (motorista, 49 anos)–, as revistas e buscas pelas equipes amadoras são brutais e humilhantes:


    Mandaram eu descer. Me empurraram, caí no chão. Pisaram em minha cabeça. Depois foram descendo todos os passageiros. Se demorasse de descer eles batiam, empurravam. Aí veio o que estava no ônibus e mandou todo mundo deitar com o rosto no chão. Dois subiram e começaram a “limpar” o carro. Aí foram pegando e colocando tudo no carro. Depois desceram e foram pegando passageiro por passageiro. Colocaram tudo no carro e saíram. Foi muito ruim mesmo (motorista, 35 anos).

    As diferenças entre os estilos de gestão das equipes também estão patentes nos modos de lidar com as reações de passageiros que: demoram para transferir seus pertences, manifestam resistência verbal não forçosa (nonforceful) (Block e Skogan, 1986), resistem a entregar seus bens e tem crises emocionais. Em uma linha de truculência, os assaltantes agridem pessoas que demoram, por nervosismo, para fazer a transferência dos bens, abrindo seus acessórios de viagem – bolsas, mochilas, valises – e disponibilizando seu conteúdo para aqueles. Isso aconteceu com um rapaz que foi golpeado na cabeça para apressar a abertura da sua valis (assistente social, 43 anos). A violência física também foi utilizada contra uma senhora de idade, em um episódio similar: “eles bateram na cara da coitada porque ela demorou para dar os pertences. Acho que ela ficou nervosa na hora e demorou para entregar” (motorista, 38 anos). A situação se agrava quando o passageiro além de demorar para disponibilizar seus bens, tenta argumentar com eles (Block e Skogan, 1986).


  11. Ainda segundo esta entrevistada: “Na hora que eu implorei pra eles não levarem minhas mercadorias, esse safado disse: ‘sua puta, antes você perder essas muambas do que eu gastar a minha bala com você, se dê por satisfeita por só estarmos levando esses lixos’. Eu olhei pra cara dele, chorei tanto (...). Aquele maldito me xingar de puta, chamar o meu trabalho de muamba e de lixo ... senti uma dor que nunca pensei em minha vida” (comerciante, 45 anos).



    Teve um passageiro que tentou reagir e apanhou muito mesmo. E ele fez errado, também. Nessas horas você não pode reagir, entende? Não que ele tenha reagido, mas foi “bater boca”, falando demais, sabe? Mandaram ele abrir a mochila. Mas ele não conseguia, não sei. Só sei que ele foi tentar explicar, pedir calma e os caras já foram batendo. Eu ouvia “Calma o quê, rapaz? Você está maluco? Perdeu a noção? Calma o quê?”. Aí foi pânico geral. Mulher gritava, homem gritava. O pessoal pedia para parar. Mas os caras não aliviavam (motorista, 28 anos).

    Apesar ou por causa de os assaltantes não poderem, por sua inferioridade numérica, evitar ou suprimir a resistência verbal forçosa (forceful) (Block e Skogan, 1986) e coletiva contra seus excessos, eles castigam a resistência verbal não forçosa (nonforceful) (1986) da vítima que ousa, no seu pedido de clemência, uma abertura de diálogo e um protagonismo que precisa ser negado (Sykes e Matza, 2008).

    A resposta dos profissionais ao que denominamos de resistência material – para diferenciar da física e da verbal (Block e Skogan, 1986) – ou recusa das vítimas em entregar seus bens (ou parte destes) é ilustrada pelo tratamento ministrado a um comerciante em viagem de compras que, embora tenha corrido para o mato com o dinheiro que carregava, foi recapturado sem represália (lojista, 52 anos). Por seu turno, o estilo amador é exemplificado por três outros casos que, ao contrário do anterior, foram violentamente punidos: um homem que ocultou seu celular barato embaixo do banco e teve que entregá- lo, depois de ser descoberto e de apanhar por isto, para evitar o pior (lojista, 52 anos), outro passageiro que recebeu uma coronhada por ter escondido dinheiro entre os bancos do ônibus (motorista, 45 anos) e um terceiro que sofreu dois socos e um chute por também ter ocultado dinheiro dentro da cueca (pintor de parede, 39 anos). Afora esses exemplos, foi citada a situação de uma senhora que, mesmo tendo desmaiado, quase foi despida à força para o procedimento de uma busca (motorista, 45 anos ). Tudo indica que esse uso da violência física visa a otimizar o tempo e dissuadir resistências materiais por parte dos demais passageiros.

    Ademais, há os espancamentos de passageiros que não conseguem conter, mesmo quando advertidos, crises de choro suscitadas, exatamente, por essa amplificação do medo.14 Em lugar de ampliar a margem de colaboração dos assaltados, esse estilo amador gera emoções contraproducentes para a condução do roubo que fazem os assaltantes incrementarem, ao modo de um efeito pingue-pongue, o uso da violência física para obterem o que desejam ou manterem a reputação (Jacobs, 2013): “Todo mundo ficou deitado, e os outros cinco rapazes com as armas apontadas dizendo que iriam matar todos nós. Foi aí que ‘bateu’ o desespero. Imploramos, pedimos para eles não fazerem isso. Mas eles diziam coisas horrorosas. Tinha uma senhora operada dos seios e eles batiam [por conta de uma crise de choro] nela” (estudante, 23 anos). Novamente, a superioridade numérica


  12. Ao lado disso, tal amplificação pode levar a um estresse agudo, com somatizações, sentimentos de desrealização e despersonalização temporários (Fabião et al., 2008; Hollander e Simeon, 2006) que, por sua vez, intensificam a percepção das ameaças e dos perigos (professora, 33 anos).



    somada com a tensão e o desespero fazem com que os demais passageiros desafiem, até certo ponto, o frame coercitivo, elevando a tensão e contribuindo, possivelmente, para respostas violentas adicionais da parte dos infratores.

    Junto com a violência psicológica e física, a interação coercitiva agrega a ameaça do abuso sexual. Tal dimensão está presente e é facilitada quando os passageiros são obrigados a tirar parte ou toda a roupa na frente de todos (Paes-Machado e Levenstein, 2004; Folha de S. Paulo, 18/8/2006, 11/11/2008). Isso quebra a representação social do que pode ser mostrado em público (Goffman, 1975) e contribui para o sentimento de violação, sobretudo quando a revista envolve o apalpamento das partes íntimas femininas: “Um fez uma revista de rotina e o outro a gente considera que fez um abuso sexual, porque ele apalpou as partes íntimas da gente de forma contundente, acho que no sentido de humilhar a vítima, e ele era mais cruel” (professora, 33 anos).15 A exibição carnavalesca de roupas íntimas, por seu turno, derruba outras barreiras simbólicas que circunscrevem e protegem o corpo da violência (Caldeira, 2000): “De uma amiga minha tiveram a capacidade de levar tudo e só deixar uma calcinha e um sutiã assim no banco” (professora, 33 anos). A partir daí, o próximo passo é o abuso sexual.


    Eles “pegaram” uma moça, lá. Ela desceu com todo mundo, mas um deles mandou ela subir. O pessoal ainda reclamou, pediu para eles liberarem a moça, que ali todo mundo era trabalhador. A moça subiu [...]. Só depois que ela disse que ele pediu pra fazer nele… você sabe... com a boca. Ela disse que pediu para eles não fazerem nada com ela, que não matasse. Foi o que ela contou [...]. Eles não respeitam homem, imagina mulher. Ela não fez nada. Mas ele estava querendo, e ela sobrou (motorista, 37 anos).

    Aqui a expressão do poder sofre uma mutação: do uso da força para a dominação, retomando as lentes weberianas. A força é explícita, muscular e masculina; eles lançam mão dela para provocar medo e demonstrar autoridade. Mas isso pode se transformar em um exercício cansativo que requer compensações. Nas apalpadelas e no estupro os assaltantes não precisam mais usar a força bruta, basta que mantenham uma atitude de dominação; o criminoso se sente Senhor, dominus, em latim. Seu poderio se dá por consenso e submissão. E as vítimas certamente reconhecem tal simbolismo de autoridade. É nítida a alquimia psicossocial que ocorre nessa passagem: a força é empregada para a apropriação de bens materiais; a dominação, para obter bens simbólicos, realizar fantasias e experimentar a embriaguez do poder.


    Libertação


  13. Verificar também este outro depoimento: “Um deles [dos assaltantes] começou a dizer que eu era bonita e a pegar em mim, a passar a mão no meu braço, nas minhas pernas, porque eu estava de saia (...) Nesse momento pensei que eles me levariam junto com eles...fiquei arrasada, [depois disso fiquei] cinco dias sem dormir direito, fiquei mal ... e o tempo todo tentei manter a calma. Por dentro ficava pedindo a Deus misericórdia (Assessora de imprensa, 29 anos).



    A retirada dos assaltantes também é o momento em que tripulantes e passageiros precisam enfrentar as repercussões imediatas e mediatas da transação coercitiva. Mal os infratores saem de cena,16 as vítimas entram em um momento de catarse emocional: choro, solidariedade, euforia e raiva se misturam. A raiva, por sinal, que estava represada, vem à tona sob a forma de reações compensatórias, de bravatas para recuperar a face ou restaurar a autoestima masculina abalada pelo processo coercitivo (motorista, 39 anos). Muito além dos rompantes, o sentimento de revolta leva os assaltados a negarem o principio de autoridade representado pela legalidade constitucional, o devido processo legal e o policiamento democrático que deveria pautar a regulação dos delitos: “As pessoas... sentem frustração por ter perdido seus pertences, por que são agredidas; depois tem gente que defende bandido, por mim a polícia podia matar todo dia um bandido, não iria fazer nenhuma falta” (motorista, 38 anos). Não é à toa que nesse drama do crime à brasileira, a vitimização por roubos forneça justificativas para aprovação de execuções dos infratores pela polícia (Cano, 2010) ou por simples cidadãos.

    Quanto ao motorista, ainda que partilhe os sentimentos de medo e alívio, ele reassume aos poucos seu papel de condutor e líder e passa a demonstrar domínio da situação. Às vezes, quando o rodoviário impactado pelo frame coercitivo, tarda para fazer isto, um passageiro mais determinado pode tomar a frente com apoio dos demais (assessora de imprensa, 29 anos). O primeiro desafio é deixar o local onde foram levados e confinados para o saque. Isso é mais fácil de resolver quando os ônibus não foram danificados durante a captura e podem retomar o rumo da estrada principal. Nesses casos, o rodoviário respeita o prazo de espera estabelecido pelos assaltantes antes de seguir viagem (motorista, 45 anos).

    As advertências verbais dos infratores para imobilizar as vítimas – ganhando tempo para fugir, retardar a comunicação do roubo (Luckenbill, 1981) e transportar os bens roubados identificáveis (Oliveira, 2007) até os pontos de entrega – exploram seu medo, projetando-o, de modo imaginário, no futuro imediato. É o modo de eles deixarem sua marca ou de buscarem estender seu controle sobre a cena depois de deixarem o local (Wright e Decker, 1997; Copes et al., 2012). Em certas situações, tais advertências, que jogam com a onipotência narcísica dos assaltantes, são acompanhadas por performances complementares: disparos para o ar e medidas de contenção física (Luckenbill, 1981), como jogar fora ou destruir a chave de ignição do veículo.17 Tripulantes e passageiros, incluindo pessoas idosas e crianças, são forçados, então, a caminhar, temendo outros ataques predatórios, vários quilômetros até a estrada principal para pedir ajuda a eventuais moradores ou motoristas em trânsito (motorista, 35 anos).


  14. Após abrirem ou mandarem o motorista abrir o bagageiro, os mal feitores fazem uma rápida triagem para escolher o que será levado e carregam os bens em carros e utilitários, no lombo de animais ou até mesmo a pé. Em contrapartida, nos roubos a ônibus urbanos os assaltantes usam esses transportes para se aproximarem das rotas de fuga (Paes-Machado e Levenstein, 2004).

  15. Eles também podem amarrar, amordaçar e prender as vítimas nos bagageiros do ônibus (Folha de S. Paulo, 13/2/1984, 23/3/1984, 7/1/1987, 18/8/2006).



Na sequência e antes de prosseguirem viagem até o local de destino, eles devem registrar queixa na delegacia mais próxima, o que pode significar, no caso de um estado extenso e subpovoado como a Bahia, uma longa distância, além de um tempo exaustivo, já que envolve muitas pessoas. E, de fato, esses registros pouco ou nada contribuem para o esclarecimento dos fatos, o desmantelamento das redes dos assaltantes e mudanças no padrão de policiamento das estradas.

A viagem desastrosa nas “margens do Estado” vai se desdobrar em outras preocupações e providências. Urge ligar para parentes e empregadores, porém como fazê-lo se o celular também foi roubado? Evidentemente, os passageiros também não podem pagar despesas com alimentação e passam a depender da boa vontade de terceiros. Para os rodoviários é difícil evitar, pelas regras vigentes nas empresas de transporte, o retorno mais ou menos imediato ao trabalho no mesmo itinerário e horário onde aconteceu o assalto, o que pode provocar vitimizações análogas. Além de ter que lidar com o trauma vivido, as vítimas, em especial os pequenos comerciantes que transportam mercadorias nos ônibus, são obrigadas a arcar com os prejuízos financeiros sem nenhuma indenização por parte das empresas de transporte ou das autoridades públicas, como acontece no Reino Unido e em outros países avançados. Mas, afinal de contas e como acrescentou um entrevistado: “As pessoas perderam as coisas, mas não foi perda total, entende? Porque vida é perda total. Se você perde a vida, não recupera mais” (motorista, 32 anos).


Reflexões finais

Neste trabalho sobre percepção de medo e gestão de vítimas, analisamos os padrões de transação e confronto (Luckenbill, 1981; Best e Luckenbill, 1982) entre tripulantes e passageiros de ônibus interurbanos e os chamados assaltantes de estrada. Conquanto o foco sejam as interpretações, as reações e as respostas das vítimas, buscamos levar em conta a manipulação do medo (Jacobs, 2012, 2013), a gestão de cenas e circunstâncias (Copes et al., 2012) e as habilidades gestoras (Gill, 2000, 2001) acionadas pelos perpetradores. Somente no ano de 2013, tal crime inédito, ignorado pela antiga sociologia do desvio e pela mais recente criminologia da vida cotidiana (Garland, 2002), atingiu 17.816 passageiros no estado da Bahia, onde foram registrados 524 casos. Além de este crime aquisitivo operar como uma espécie de imposto regressivo sobre os pobres (Downes, 1983), que prejudica a posse, o uso e o comércio de bens que integram as condições de reprodução social, ele restringe o direito de ir e vir, e, por extensão, o transporte de pessoas.

Apesar da falta do ponto de vista dos autores do crime, esta investigação fez achados acerca da influência dos alvos e do estilo de gestão coercitiva nas variações do uso da violência psicológica e física para manipular o medo e lograr a aceitação das vítimas nas distintas fases dessa troca social predatória. Efetivamente, as características do ônibus, tais como a velocidade, transitoriedade e possibilidade de ser utilizado como arma e escudo (Jacobs, 2013), constituem um desafio e uma oportunidade para os assaltantes. À medida que amplia a gama de ações de captura, a velocidade requer esquemas estratégicos específicos (Copes et al., 2012) para o estabelecimento da copresença: a infiltração dos assaltantes entre os passageiros, os bloqueios das vias e os ataques aos



veículos. Embora não tenhamos esclarecido os critérios de preferência dos infratores por tais esquemas, estes são, seguramente, mais diversificados, ousados e perigosos do que os apontados pela literatura (Gill, 2001; Jacobs, 2012, 2013; Copes et al., 2012). Ao mesmo tempo que alguns ataques precipitam desfechos desastrosos para os veículos e seus ocupantes, outros antecipam claramente o compartilhamento da definição de situação de roubo com o motorista.

A multiplicidade – quantidade e diversidade – de vítimas nesses encontros, por sua vez, contrasta com o enquadramento de um ou poucos indivíduos isolados que acontece nos roubos ordinários (Luckenbill, 1981; Best e Luckenbill, 1982; Gill, 2001; Jacobs, 2012, 2013; Copes et al., 2012). O fato de o roubo a ônibus atingir de modo sucessivo e diferenciado uma média de trinta vítimas de cada vez tem implicações significativas sobre o gradiente de violência psicológica e física empregado para a manipulação do medo.

De um lado, este gradiente de violência envolve performances (Turner, 1987; Alexander, 2004) que exibem, potencializam e contribuem para a materialização de ações que sensibilizam as vítimas. Diferentes das ações violentas discretas contra alvos discretos que estão presentes na totalidade dos roubos, tais performances são expansivas, contagiantes ou capazes de propagarem o medo entre audiências mais amplas. Entre essas exibições destacam-se os ataques cinematográficos, acompanhados por perseguição e tiros, para a captura do ônibus. Há também o arsenal de gestos, xingamentos e ameaças, seguido pelo anúncio do assalto e invasão do ônibus, que leva tripulantes e passageiros a reagirem com espanto, gritaria e pânico, para depois entrarem em uma fase de aceitação (Alexander, 2004). Em terceiro lugar, tem as performances de inversão dos papéis de autoridade entre rodoviários e infratores (Paes-Machado e Levenstein, 2004) e, eventualmente, entre estes últimos e policiais presentes. Em quarto, está a desenvoltura dos infratores, com advertências, revistas e buscas abusivas para esquadrinhar e vasculhar possíveis lugares onde os bens estão guardados ou podem ter sido escondidos, despojando e aniquilando as resistências das vítimas. Por fim, há as advertências que jogam com a onipotência dos assaltantes e medidas de contenção física para imobilizar os assaltados e estender o controle após eles terem abandonado a cena.

De outro lado, existem variações no tipo e no nível de violência que remetem aos papéis diferenciados e às reações dos tripulantes e passageiros nas diversas etapas da transação coercitiva. Nesse sentido, a vitimização psicológica dos motoristas é maior nas fases do estabelecimento da copresença (the onset) via captura do veículo e do compartilhamento da definição de situação de roubo do que nas etapas posteriores da transação, quando os passageiros substituem aqueles como os alvos principais das ameaças. A receita cruel dessa vitimização envolve a intermitência das ameaças e reforço para promover a sensação de medo (Jacobs, 2013) e dificultar a retomada de agência das vítimas. Afora isso, supomos que essas ameaças operam como lembretes de prontidão para os próprios assaltantes. Um achado importante diz respeito às diferenças entre assaltantes amadores e profissionais no que tange às habilidades gestoras (Gill, 2000, 2001). Apesar de as espirais de violência ligadas aos roubos e às respostas policiais excessivas contra os mesmos influenciarem no aumento das agressões físicas contra as vítimas e, portanto, na diluição das diferenças



entre essas categorias de assaltantes, os profissionais continuam se distinguindo por sua competência para manipular o medo e alargar a margem de colaboração dos assaltados. De qualquer modo, a vitimização psicológica provocada por uns e outros assaltantes atinge tais extremos em algumas cenas, como as da invasão e desvio do veículo e das buscas, que geram pânico entre os alvos.

A vitimização física apresenta um padrão semelhante. No que se refere aos motoristas, ela também é mais elevada na fase crítica do estabelecimento da copresença, em especial nos casos em que eles ofereceram resistência para parar o veículo; no caso dos passageiros, ela é maior na progressão do roubo (Lindegaard et al., 2015), em especial na etapa da apropriação dos bens. As evidências sugerem que este pico de vitimização resulta também do estilo de gestão amadorístico de uma parte dos assaltantes e, por conseguinte, do modo como estes lidam com as reações dos assaltados, como: a demora para entregar os pertences, a resistência verbal não forçosa (nonforceful) e forçosa (Block e Skogan, 1986), a resistência material e as crises emocionais. Ao mesmo tempo que fomenta emoções contraproducentes para a condução do roubo, o amadorismo faz os assaltantes incrementarem, ao modo de um efeito pingue-pongue, o uso da violência física para obter o que desejam, reestabelecer a autoridade ou manter sua reputação (Jacobs, 2013). Além dessa noção de resistência material, a pesquisa verificou a existência de uma modalidade coletiva de resistência verbal forçosa – favorecida pela superioridade numérica dos passageiros e pela duração mais longa dessa modalidade de roubo – para interromper ou reduzir a violência crescente contra algumas vítimas, que não havia sido analisada até aqui pela literatura especializada. Em suma, a percepção de medo depende do balanço cambiante entre o estilo de gestão dos assaltantes e as respostas dos assaltados nas diversas etapas dos roubos.

Por fim, a inefetividade das agências policiais estaduais torna imprescíndivel a formação de uma força tarefa com a participação de agências federais para combater esse crime. Em lugar das ações pontuais e violentas que tem predominado até aqui, é necessária uma atividade contínua de inteligência e investigação para desmantelar as redes criminosas e preservar a segurança e tranquilidade de motoristas e passageiros desse importante meio de transporte.


Referências

Ágel, Arturo. (2013), “Las rutas del Hampa”. 24 Horas – El Diario sin Límites, fev. Disponível em http://www.24-horas.mx/las-rutas-del-hampa/, consultado em 4 mar. 2014.

AGERBA – Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos de Energia, Transporte e Comunicações da Bahia. (2014), “Informações sobre transporte de passageiros”. Disponível em www.agerba.gov.ba, consultado em dez. 2014.

AQUINO, J. P. D. & SÁ, L. D. de. (2014), “Consideração e competência entre assaltantes: etnografias da socialidade armada”, in C. Barreira, J. P. D. Aquino e L. D. de Sá, Violência, ilegalismos e lugares morais. Campinas, Pontes.



ALEXANDER, J. C. (2004), “Cultural pragmatics: social performance between rite and strategy”. Sociological Theory, 22 (4): 527-573.

ANTT – Agência Nacional de Transporte Terrestre. (2007), “Relatório anual”. Disponível

em www.antt.gov.br, consultado em dez. 2009.

ABRATI – Associação Brasileira Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros. (2008), “Relatório nacional anual de 2007”. Disponível em www.antt.gov.br, consultado em 6 nov. 2009.

BEST, J. & LUCKENBILL, D. F. (1982). Organizing deviance. New Jersey, Prentice- Hall.

BLOCK, R. & SKOGAN, W. G. (1986), “Resistance and nonfatal outcomes in stranger-to- stranger predatory crime”. Violence and Victims, 1 (4): 241-253.

BLUMSTEIN, A. & WALLMAN, J. (eds.). (2006), The crime drop in America. Nova York, Cambridge University Press.

CALDEIRA, T. P. do R. (2000), A cidade de muros: crime, segregação e cidadania em São Paulo. São Paulo, Editora 34/Edusp.

CANO, I. (2010). Direitos Humanos, Criminalidade e Segurança Pública. In G. Venturi (Ed.), Direitos Humanos: Percepções da opinião pública, 65-75. Brasília: Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.

CLOWARD, R. A. & OHLIN, L. E. (1960), Delinquency and opportunity. Nova York, Free Press.

CNT – Confederação Nacional de Transportes. (2007), “Pesquisa Rodoviária”.

Disponível em www.cnt.org.br, consultado em 6 nov. 2009.

COHEN, L. E. & FELSON, M. (1979), “Social change and crime trends: a routine activities approach”. American Sociological Review, 44: 88-100.

COPES, H.; HOCHSTETLER, A & CHERBONNEAU, M. (2012), “Getting the upper

hand: scripts for managing victim resistance in carjackings”. Journal of Research in Crime and Delinquence, 49 (2): 249-268.

CORNISH, D. & CLARK, R. (1985), “‘Modeling offenders decisions’: a framework for research and policy”, in M. Tonry e N. Morris, Crime and justice, Chicago, University of Chicago Press.

COSTA, L. et al. (2003), “Morbidade declarada e condições de trabalho: o caso dos motoristas de São Paulo e Belo Horizonte”. São Paulo em Perspectiva, 17 (2): 54-67.

DEAKIN, J.; SMITHSON, H.; SPENCER, J. & MEDINA-ARIZA, J. (2007), “Taxing

on the streets: understanding the methods and process of street robbery”. Crime Prevention and Community, 9: 52-67.

DOWNES, D. (1983). Law and order: theft of an issue. Londres; Fabian Society. EINSTADTER, W. J. (1966), Armed robbery: a career study in perspective.

Berkeley, PhD Thesis, University of California.



EMERSON, R. M.; FRETZ, R. I.; SHAW, L. L. Processing Fieldnotes: Coding and Memoing. In: (Org.) Writing Ethnographic Fieldnotes. Chicago & London: The University of Chicago Press, 1983, p.142-168.

FABIÃO, C.; BARBOSA, A.; FLEMING, M. & SILVA, C. (2008), “Rastreio da perturbação de somatização nos cuidados primários de saúde: um estudo piloto”. Acta Med. Port., 21 (4): 319-328.

FELSON, M. (2006), Crime and nature. Thousand Oaks/Londres/New Delhi, Sage.

. (2008), “Ladrões deixam sacoleiros nus após roubo”. Folha de S. Paulo,

11 nov.

FRANCISCO, L. (2003), “Quadrilha fecha rodovia e assalta quatro ônibus”. Folha de

S. Paulo, 20 mar.

GARLAND, D. (2002), The culture of control-crime and social order in contemporary society. Oxford, Oxford University Press.

Gill M L (2000), Commercial robbery: offenders perspectives on security and

crime prevention, London: Blackstone Press.

GILL, M. (2001), “The craft of robbers of cash-in-transit vans: crime facilitators and the entrepreneurial approach”. International Journal of the Sociology of Law, 29 (3): 277-291.

GOFFMAN, E. (1975), A representação do eu na vida cotidiana. Petrópolis, Vozes. HALLSWORTH, S. (2005). Street crime. Cullompton, Devon, Willan.

HOBBS, D. (1988), Doing the business: entrepreneurship, dectectives and the working class in the East End of London. Oxford/Nova York, Oxford University Press.

HOLLANDER, E. & SIMEON, D. (2006), “Transtornos de ansiedade, in R. Hales e S. C. Yudofsky, Tratado de psiquiatria clínica, Porto Alegre, Artmed.

HUGGINS, M. K. et al. (2006), Operários da violência: policiais torturadores e assassinos reconstroem as atrocidades brasileiras. Brasília, Editora da UnB.

JACOBS, B. A. (2012), “Carjacking and copresence”. Journal of Research in Crime and Delinquency, 49 (4): 471-488.

.(2013),“Themanipulationoffearincarjacking”. Journal of Contemporary Ethnography, 45 (5): 523-544.

KATZ, J. (1988), Seductions of crime: moral and sensual aspects of doing evil.

Nova York, Basic Books.

LETKEMANN, P. (1973), Crime as work. Englewood Cliffs/New Jersey, Prentice-Hall. LINDERGAARDEN, M. R.; BERNASCO, W. & JACQUES, S. (2015), “Consequences

of expected and observed victim resistance for offender violence during robbery

events”. Journal of Research in Crime and Delinquency, 52 (1): 32-61.

LINGER, D. (1992), Dangerous encounters. Stanford, Stanford University Press.



LUCKENBILL, D. (1981), “Generating compliance: the case of robbery”. Journal of Contemporary Ethnography, 10: 25-46.

MATTHEWS, R. (2002), Armed robbery. Devon/Portland, Willan Publishing.

McCLUSKEY, J. D. (2013), “A comparison of robbers’ use of physical coercion in commercial and street robberies”. Crime & Delinquency, 59 (3): 419-442.

MISSE, M. (2008), “Sobre a acumulação social da violência no Rio de Janeiro”. Civitas, 8 (3): 371-385.

NORMANDEAU, A. (1968), Trends and patterns in crimes of robbery.

Unpublished dissertation, University of Pennsylvania, Philadelphia.

OLIVEIRA, I. M. S. (2007), Do vapor ao sapatinho: organização das quadrilhas e gerenciamento de vítimas de roubos a banco. Salvador, dissertação de mestrado, Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia.

PAES-MACHADO, E. & LEVENSTEIN, C. (2004), “I’m sorry everybody, but this is Brazil: armed robbery on the buses in Brazilian cities”. Brit. J. Criminol., 44: 1-14.

. & RICCIO-OLIVEIRA, A. (2010), “The deliveries cannot stop: Ecological (dis) advantages and socio-spatial safety tactics against predatory crimes among Brazilian couriers”. Crime, law and social change. 54, 3-4, p. 241-261.

. & NASCIMENTO, A. M. (2011), “Bank employees don’t go to heaven: processes of victimization of bank employees for violent crimes”, in A. N. Hutcherson (ed.), Psychology of victimization, Nova York, Nova Science Publishers.

. & NASCIMENTO, A. M. (2014), “Conducting danger: governance, networks, and layperson security intelligence among taxi drivers”. International Journal of Comparative and Applied Criminal Justice, 38 (1): 1-22.

PERÚ 21. (2010), “No hay seguridad en carreteras del Perú”. Péru 21, 14 jul. Disponível em http://peru21.pe/noticia/596272/no-hay-seguridad-carreteras, consultado em 4 mar. 2014.

POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL. “BR-116: Assaltos migram para trecho sem luz”. Disponível em http://sinprfrj.org.br/pt-br/content/br-116-assaltos-migram-para- trecho-sem-luz, consultado em 18 set. 2010.

REIS, T. (2014), “GO e DF concentram mais da metade dos assaltos a ônibus em rodovias”. Portal de Notícias da Globo – G1 Brasil. Disponível em http://m.g1.globo. com/brasil/noticia/2014/02/go-e-df-concentram-mais-da-metade-dos-assaltos- onibus-em-rodovias.html?menu=5c719a78bd00b16, consultado em 1º mar. 2014.

ROITMAN, J. (2004), “Productivity in the margins: the reconstitution of state power in the Chad basin”. in V. Das e D. Poole, Anthropology in the margins of the State. Santa Fé, School of American Research Press. pp. 191-224.

SSP-BA – Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia (2007), “Registros de roubos a ônibus”. Salvador, SSP-BA.

. (2014), “Registros de roubo a ônibus”. Salvador, SSP-BA.



ST. JEAN, P. (2007), Pockets of crime: broken windows, collective efficacy and

the criminal point of view. Chicago/Londres, University of Chicago Press.

SYKES, G. M. & MATZA, D. (2008), “Técnicas de neutralización: una teoria de la delincuencia”. Caderno CRH, 21 (52): 163-170.

TARK, J. & KLECK, G. (2004), “Resisting crime: the effects of victim action on the outcomes of crime.” Criminology, 20 (2), 89-116.

TEDESCHI, J. & FELSON, R. B. (1994), Violence, aggression, and coercive actions. Washington, DC, American Psychological Association.

TELLES, V. da S. (2010), A cidade nas fronteiras do legal e ilegal. Belo Horizonte, Argumentum.

TURNER, V. (1987), “The anthropology of performance”, in Victor Turner, The anthropology of performance, Nova York, PAJ Publications.

VIODRES-INOUE, S. R. & PAES-MACHADO, E. (2010), “A organização social do roubo com confinamento forçado: o caso dos ônibus interurbanos executivos em rodovias”. Anais do 34º Encontro Anual da Anpocs, pp. 1-25.

VOLKOV, V. (2002), Violent entrepreneurs: the use of force in the making of Russian capitalism. Ithaca/Londres, Cornell University Press.

WRIGHT, R. T. & DECKER, S. H. (1997), Armed robbers in action. Boston, Northeastem University Press.

ZALUAR, A. (1994), “A moeda e a lei”, in , Condomínio do diabo, Rio de Janeiro, Revan/Editora da UFRJ.

ZIMRING, F. E. (2007), The great American crime decline. Nova York, Oxford University Press.


Diario FOLHA DE S. PAULO:

FOLHA DE S. PAULO. (1971), “Ônibus assaltado”. Folha de S. Paulo, 4 fev.

. (1984), “O saque ao ônibus de turismo”. Folha de S. Paulo, 13 fev.

. (1984), “Apurado roubo contra turistas”. Folha de S. Paulo, 23 mar.

. (1985), “Ladrões trocam tiros em ônibus na Dutra e um morre”. Folha de

S. Paulo, 24 maio.

. (1985), “Bandidos em Manhuaçu sequestram ônibus e saqueiam passageiros”.

Folha de S. Paulo, 29 jul.

. (1987), “Turistas argentinos assaltados no Rio Grande do Sul”. Folha de S. Paulo, 7 jan.

. (1988), “Assaltante mata passageiro que dormia no ônibus”. Folha de S. Paulo, 14 dez.

. (1989), “Rio-Petrópolis: roleta russa nos ônibus”. Folha de S. Paulo, 18 jun.

. (2001), “Ônibus tomba após cerco e é assaltado”. Folha de S. Paulo, 2 ago.



. (2003), “Falsos PMs assaltam ônibus de sacoleiros”. Folha de S. Paulo, 21 out.

. (2004), “Violência faz ônibus sair em comboio na BA: medida foi tomada após 99 assaltos registrados em 2004”. Folha de S. Paulo, 20 maio.

. (2006), “Sacoleiros ficam presos no bagageiro”. Folha de S. Paulo, 18 ago.

. (2007), “Ônibus cai em ribanceira durante assalto em MG”. Folha de S. Paulo, 24 nov.



Vol 26, N°2


Esta revista fue editada en formato digital y publicada en junio de 2017, por el Fondo Editorial Serbiluz, Universidad del Zulia. Maracaibo-Venezuela


www.luz.edu.ve www.serbi.luz.edu.ve produccioncientifica.luz.edu.ve